terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Uma 'corrente pra frente'

     Há uma semana, exatamente, desanquei, aqui no Blog - no texto 'É para encher a cara' -, a pusilanimidade do nosso governo, ao ceder às exigências de essa tal de Fifa, para não perder o Mundial de 2014. Naquele dia, anunciava-se que um deputado qualquer do PT, não por acaso o relator da Lei Geral da Copa, seguindo - é claro! - ordens superiores, estava cometendo uma atentado à nossa soberania, mudando até o Estatuto do Torcedor, ao propor a liberação da venda de bebidas alcoólicas nos estádios. Essa decisão, naquele momento, seria estendida, também, aos jogos das competições nacionais.
     O deputado mudou de ideia. Ele sugere, agora, que os torcedores só possam encher a cara, nos estádios, durante a Copa - como exige a Fifa, é bom não esquecer -, em função dos patrocínios de empresas de bebidas. 'Às favas com nossos escrúpulos', deve estar pensando o nobre representante do povo, como se fosse um ministro (*) ao assinar o Ato Institucional Número 5 (o AI-5), num 13 de dezembro, naquele ano de 1968, que insiste em não acabar, como bem intuiu Zuenir Ventura, um antigo companheiro de redação - a quem recomendei a compra de um determinado modelo de automóvel, certa vez -, referência para minha geração no Jornal do Brasil.
     Naqueles idos de 1968, eu mal havia começado minha vida profissional. Era um novato - um foca total - que completara 35 dias de estágio na Agência Meridional, dos Diários Associados, destinada a produzir, principalmente, o O Jornal, o órgão líder da cadeia arquitetada por Assis Chateaubriand, morto há pouco mais de seis meses.
     Daquele dia - 'O Dia dos Cegos', uma maravilhosa sacada editorial, que remetia ao Dia de Santa Luzia, a protetora dos olhos -, guardo as lembranças da revolta produzida na minha geração e, até hoje, um exemplar completo do JB, nosso 'concorrente' e onde eu trabalharia, a partir de janeiro de 1982, já na Avenida Brasil, 500. Um exemplar que fez história.
     Quarenta e três anos depois, enxergo um novo dia para ter vergonha. Sem qualquer resquício de escrúpulo, arma-se, no Congresso, uma trama para justificar o injustificável, livrando a Presidência de um risco sobretudo eleitoral. Para 'adoçar', o relatório acena com fantasias demagógicas, como ingressos mais baratos para indígenas, pessoas de baixa renda (metade da população brasileira, mais ou menos) e para quem aderir à Campanha de Desarmamento.
     Taí uma boa notícia para a turma que fugiu do Alemão e da Rocinha e faz parte de milícias: basta entregar as armas para ter desconto no ingresso e torcer pela nossa Seleção. Afinal, vivemos tempos de uma dissoluta "corrente p'ra frente".

     (*) Teria sido a reação do então ministro do Trabalho e Previdência Social, coronel Jarbas Passarinho, antes de assinar o Ato que jogou o país num estado de exceção. A frase completa teria sido: "Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência". O presidente, na época, era o general Artur da Costa e Silva.
     (**) Em 1969, conheci pessoalmente Jarbas Passarinho, durante sua passagem pelo Ministério da Educação, que eu cobria para o O Jornal. Um dos momentos dessa 'relação' está contado no ensaio 'Nariz de Cera'.

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