sábado, 30 de abril de 2011

Uma aventura caribenha - Capítulo 12

Segunda-feira -  26/07/99 - Lembranças atrasadas

     Rio Madeira, Amazonas  (17h33) - Há algumas lembranças do caminho que, por algum motivo (ou não), deixaram de ser incluídas nos textos anteriores. Algumas são realmente interessantes; outras, nem tanto. Não custa conferir uma delas, que surgiu durante a navegação, quando observávamos os pássaros nas árvores das margens:
     Os gaviões da estrada - os gaviões sempre despertaram em mim muita curiosidade. Têm um vôo elegante e atacam com uma rapidez impressionante. Assim, por acaso, observando seus vôos no caminho, reparei que havia uma certa constância no espaço entre o aparecimento de cada exemplar. Comecei a marcar e não deu outra: cada gavião ocupava um território distante de cerca de 1,1 quilômetro do outro.
     Durante bom tempo, na falta de coisa melhor para fazer, na estrada de Cuiabá para Porto Velho, esqueci o odômetro e passei a calcular a distancia percorrida com base no surgimento dos gaviões. O erro foi mínimo.

Parceiros de genocídio

     A verdadeira face do ditador Bashar Al- Assad, da Síria, está cada vez mais bem definida. É a imagem da intolerância, do ódio aos contrários, da arrogância que costuma acompanhar governantes 'eleitos' pela força das balas. O número de civis assassinados durante protestos por liberdade se aproxima rapidamente de mil. Só ontem foram 62.
     Embora condenado pela maioria dos países, o regime sírio vem desafiando o mundo, sob os olhares companheiros da China, Cuba e da Rússia, que votaram contra a criação de uma comissão para investigar a violação de direitos fundamentais, afinal aprovada, com o voto brasileiro.
     O sacrifício de centenas de pessoas parece mesmo não comover os governos russo e chinês, não por acaso genocidas históricos, e cubano, um dos mais medíocres e bolorentos da atualidade.
     Essa mesma tolerância vem ajudando o terrorista Muammar Kadafi a se manter no poder, apesar de condenado pelo mundo livre.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

A opção pelo crime


     O PT oficializou sua opção pelo crime, ao eleger, por aclamação, é claro, seu novo presidente, o deputado estadual paulista Rui Falcão, aquele mesmo da produção de dossiês quando da última campanha presidencial. Antes, já formalizara o perdão público e a readmissão de ex-secretário Delúbio Soares, responsável, ao lado do publicitário mineiro Marcos Valério, pela formatação do mensalão - esquema fraudulento que garantiu a distribuição de dinheiro público a partidários e outros comparsas.
     Tudo, sob as bênçãos do ex-deputado José Dirceu  (apontado pelo procurador-geral da República como o chefe de uma quadrilha que assaltou os cofres do País) e do ex-presidente Lula, maior beneficiário e estimulador – no mínimo, por falta de reação – das falcatruas havidas nos últimos oito anos.
     Esse descaramento não tem precedentes na história política brasileira e só se sustenta em virtude da absoluta falta de esclarecimento da maior parte da população; do aparelhamento do estado; da vergonhosa ‘adesão’ das entidades sindicais, que jamais foram tão ‘cordatas’; e da distribuição de bolsas à legião de miseráveis especialmente do Nordeste, a grande massa de manobra dos demagogos de ocasião.

Uma aventura caribenha - Capítulo 11

A ponte de comando do empurrador


Domingo - 25/07/99 - Aniversário a bordo do comboio para Manaus 

     Rio Madeira, Amazonas (22h56) - Domingo, segundo dia a bordo da balsa que nos leva a Manaus, ponto de partida da terceira etapa da nossa aventura caribenha, não poderia ter sido mais agradável.
     Já totalmente integrados à rotina da embarcação e adotados pela tripulação, pudemos aproveitar ao máximo o privilégio de cruzar parte do coração do brasil em condições especialíssimas: somos os únicos passageiros desse comboio (duas balsas e um rebocador) de transporte que liga Porto Velho à capital do Amazonas, num percurso de nada menos do que 1.050 quilômetros de rio.
     Nossa rotina começa cedo: acordamos praticamente com o sol, tomamos café e somos convocados para o almoço às ... 10h30. É isso mesmo: o almoço é servido às dez e meia da manhã. Às cinco da tarde, jantar. Hoje, almoçamos feijão, arroz, macarrão, salada de batatas, maionese e um assado. No jantar, galinha.
     'Dona' Creusa, cozinheira e única mulher a bordo (são nove tripulantes, ao todo), quando soube que um de nós (... eu, confesso) não comia aves, rapidamente preparou umas postas de peixe, divididas com o resto do nosso grupo.
     No final do dia, mais uma demonstração de carinho por parte da tripulação. Sabendo que João Carlos Nogueira estava festejando seu vigésimo-quarto aniversário, todos se reuniram para cantar "parabéns". João, emocionado, garantiu  que "jamais esqueceria esse dia". Foi aplaudidíssimo.

O crescimento da desigualdade

     Os últimos resultados do Censo mostram que a população brasileira, embora registre queda na taxa, continua crescendo num ritmo quase chinês, mas sem o necessário amparo de políticas de saúde (que engloba, também, saneamento básico) e habitacionais que garantam qualidade às novas vidas.
     É verdade que o fluxo desenfreado em direção às cidades do Sul reduziu de intensidade, mas é constante e a cada dia amplia as mazelas provocadas pela favelização e - mais grave e triste - subfavelização das grandes metrópoles, como Rio e São Paulo.
     Um exemplo dessa tendência foi registrado na favela da Rocinha, que registra crescimento três vezes maior do que o restante da cidade, sem o correspondente em ações sociais. Esse fenômeno, em menor escala, é uma constante em todas as demais favelas, que avançam por áreas públicas em encostas, sob o olhar complacente - e muitas vezes criminoso - dos governos.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Um prêmio à lealdade. Ou: prevaleceu a 'omertà'

     A carta - "curta e grossa", segundo Veja - já foi entregue à direção do partido. Falta pouco, portanto, para que Delúbio Soares, ex-secretário do Partido dos Trabalhadores e um dos integrantes (segundo o Procurador-Geral da República) da quadrilha que assaltou os cofres públicos e produziu o maior escândalo de todos os tempos na história do Brasil, volte ao ninho petista, acolhido carinhosamente por quase todos os líderes.
     O Globo também tratou do tema, lembrando que o parceiro mais direto do publicitário Marcos Valério no dia-a-dia do mensalão vai ser recebido num jantar especial na casa da senadora Marta Suplicy (PT-SP). Comes e bebes que, talvez, contem com a presença do ex-presidente, aquele que negou o crime do qual se beneficiou; recuou; acusou companheiros de traição; voltou a negar e, ao sair do Palácio, garantiu que ajudaria a provar que ele - o ato criminoso mais fartamente documentado da história recente da política brasileira - jamais existiu.
     A readmissão de Delúbio Soares no PT, na verdade, tem a importância que lhe confere o simbolismo. Delúbio, em si, é um personagem insignificante, mal-preparado, medíocre, na acepção da palavra (seu depoimento no Congreso, na época do escândalo, foi lamentável, em todos os aspectos). Essa volta aos braços e abraços amigos, após cinco anos de afastamento, representa, para os que se propõem a analisar, o reconhecimento à lealdade de quem calou em nome da - digamos - causa.
     A máfia - nos ensinam os filmes americanos - age assim desde sempre. Os criminosos mais simples, os 'soldados', assumem a culpa dos chefões, garantindo, com esse ato, a integridade física e o amparo de parentes. Aqui, prevaleceu uma espécie de 'omertà cabocla', um código de silêncio que ajudou a preservar o projeto petista de poder.

Histórias de Júlia e Pedro (12)

     Mais uma história de Júlia, estimulada pela anterior.
     Quando ficou sabendo que ela e Pedro eram personagens do meu blog, Júlia fez questão de ler e ouvir todas as histórias. Das mais recentes, como a que reproduz sua 'confissão' de que já conhecia "muitos palavrões", ela lembrava. De outras, mais antigas, não. Afinal, algumas coisas que são especiais para nós - pais, avós e tios -, para elas, as crianças, são comuns, por espontâneas.
     Leu e ouviu com muita atenção, rindo de quase todas as situações, como se estivesse sendo apresentada a elas naquele momento. No fim, com um  jeito bem levado, fez a pergunta que que não poderia calar:
     - Vovô, isso tudo é verdade?

BC admite gasolina 'aditivada'

     O Banco Central, ao que tudo indica, aderiu definitivamente ao país do faz-de-conta que nasceu há pouco mais de oito anos, num lugar que já se chamou Brasil e existia bem antes - podem crer! - do advento disso que se convencionou chamar de lulo-petismo.
     Não há outra explicação para o anúncio de que a gasolina deve aumentar 2,2% em 2011. Não é possível que os economistas e quetais do BC não tenham acompanhado o constante e progressivo reajuste de preços que vem ocorrendo.
     O litro da gasolina, que custava em torno de R$ 2,80 no início do ano, já está sendo cobrado a mais de R$ 3. E ainda estamos em abril. Se considermos um período maior, de doze meses, veremos que houve um aumento ainda mais indigno.
     Fica no ar, ainda, uma questão que me parece definitiva: os tais 2,2% de reajuste vão incidir sobre os mais de R$ 3 atuais? Então, meus caros, teremos, no mínimo, um acumulado muito próximo de 10%, só este ano. E se a gasolina sobe, o comerciante que vende batatas também vai querer aumentar o preço.
    
     ET: Estou me lixando para os 'estudos' que demonstrariam que o preço da gasolina deveria ser mais alto. Essa conversa é boa para quem não precisa botar a mão no bolso para encher o tanque do carro e comprar batatas, ou para quem nem sente os aumentos.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Casas de tolerantes

     Está cada vez mais difícil respeitar nossos políticos. À mediocridade da maioria, somam-se, grosseiramente, a falta de decoro, a desfaçatez e a incontinência verbal. A indicação do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) para a Comissão de Ética do Senado, por exemplo, é mais uma prova da enorme ausência de compromissos com a sociedade, de tolerância com o comportamento inadequado.
     Não há como justificar a indicação de um senador envolvido em tantos processos por falta de decoro para uma função que exige, em tese, um comportamento correto, probo. É verdade que ele conseguiu se sair bem de todas as cinco ações. Mas só o fato de elas terem existido e provocado tantas reações seria suficiente para barrar sua aprovação, assim como a de outro senador do PMDB, o sr. Romero Jucá, líder do Governo e um dos recordistas em processos.
     Há pouco tempo, tivemos a eleição do deputado federal e mensaleiro João Paulo Cunha (PT-SP) para a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, outro exemplo do desprezo do Congresso pela opinião pública. Mais recentemente, o ex-deputado do PT, José Genuíno, outro envolvido no mensalão e punido com a não reeleição em São Paulo, ganhou um cargo de consolação no Ministério da Defesa.
     O pior: esses são apenas alguns exemplos de descaso, de irresponsabilidade. Não podemos esquecer, jamais, que o ex-ministro da Fazenda, Antônio Palocci, responsável pela quebra de sigilo bancário de um simples caseiro - que o acusara de se encontrar com lobistas em uma casa 'suspeita' de Brasília -, é, hoje, um dos nomes mais fortes do Governo.

Uma aventura caribenha - Capítulo 10

João Marcos, eu e João Carlos, com a tripulação do empurrador, no Rio Madeira, em foto de Alexandre Viana


Sábado - 24/07/99 - Tecnologia dá suporte à expedição 

     Humaitá, Amazonas (23h16) - Continuamos no Rio Madeira, navegando ao largo de Humaitá, cidade/confluência de duas das mais importantes e desafiadoras estradas amazônicas, as BRs 230 (Transamazônica) e 319 (Manaus-Porto Velho). Passa pouco das 22 horas de sábado (23 horas, no rio) e nosso GPS, sistema de navegação por satélite, indica que completamos 225 quilômetros de navegação, praticamente a quarta parte dos 1.050 quilômetros que separam Porto Velho de Manaus.
     Ao mesmo tempo, nosso GPS indica que superamos a barreira das 100 horas efetivamente viajadas, nas estradas e no rio Madeira (não está computado o tempo gasto nos pernoites e na espera pelo embarque e pela execução obrigatória dos serviços de manutenção das três picapes).
     A precisão do GPS (Global Position System) é tanta que sabemos, nesse exato momento, que nosso comboio fluvial (duas balsas e o empurrador) está se deslocando a 17,6 km/h.
     Essa velocidade baixa, de segurança, fez com que nossa média de caísse para 57 km/h. Como vocês podem notar, além de funcional, o GPS é um belo brinquedinho ...
     Brinquedinho semelhante ao sistema Autotrac, que estamos usando para enviar os textos sobre as diversas fases e acontecimentos do Projeto Integração, que vai nos levar ao Caribe, através de três regiões absolutamente especiais: o Pantanal Mato-Grossense, a Amazônia e a Grande Savana venezuelana.
     Usando o sistema Autotrac, que por acaso também equipa nosso rebocador (foi desenvolvido para garantir a comunicação entre frotas e as centrais), enviamos nossos textos, via satélite, para uma base instalada no Rio de Janeiro. O processo é rápido e absolutamente simples.
     Como é simples e eficiente o manuseio do telefone mundial Nera que também faz parte da tecnologia agregada à expedição. Graças a ele, e usando os serviços da Telenor, podemos manter contato direto com o mundo todo, a qualquer hora do dia ou da noite (o Nera usa os sinais de sete satélites). Até mesmo daqui, do meio da Amazônia, onde nossos celulares viraram peças decorativas.

     PS: Há 12 anos, os notebooks ainda eram meros objetos de desejo para nós. Além de, no nosso caso, não atenderem às necessidades.

A hora da depuração

     A crise, especialmente no PSDB e DEM, provocada, principalmente, pela debandada para o PSD do prefeito Gilberto Kassab, pode ser muito saudável para a oposição. Essa depuração vai deixar bem claro que os que ficam têm alguma ideologia em comum, seja ela qual for, e não apenas o desejo irresistível manter as enormes benesses que fazem parte do pacote a que todo parlamentar tem direito.
     Seria ideal, para a oposição, bem entendido, que esse enxugamento forçado viesse acompanhado, também, de uma revisão de conceitos, de uma boa dose de humildade e espírito público, em especial lá pelas bandas de São Paulo, onde o governador Alckmin e eterno candidato a tudo José Serra travam uma enorme batalha de egos.
     O Brasil - é fundamental que os líderes do PSDB aprendam - não se limita a São Paulo, embora nosso (dos cariocas) vizinho do Sul seja o estado mais importante da federação. Ao circunscrever a manutenção do poder, a oposição (leia-se PSDB) abre mão de uma visão mais abrangente do país, assume um sotaque cosmopolita, cede espaços.
     Com o DEM vem ocorrendo fato semelhante. A perda de identidade gerou uma irreversível queda de representação e, por consequência, de prestígio.
     A fusão dos dois partidos, ainda rejeitada pelos caciques de ambos, temerosos de perder espaço, pode ser, como admitiu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, um caminho. É evidente que uma eventual compressão das duas bancadas provocaria a saída de alguns, reduzindo os números absolutos. Mas certamente daria mais sedimentação a uma face da política que é fundamental em uma democracia: o contraditório.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Histórias de Júlia e Pedro (11)

A conquista de novos amigos 

    Vou me permitir voltar a um dos temas que mais me comovem: Júlia e Pedro. A história de hoje aconteceu há pouco mais de um ano, quando dos primeiros dias de Júlia na nova escola, o Pedro II, colégio onde passei alguns dos melhores anos da minha vida (de 1960 a 1963 na Tijuca; e de 1964 a 1966 na Sede, no Centro).
     O temor de todos - de que a mudança de uma escola pequena e com atendimento bem personalizado provocasse um choque - não se concretizou, felizmente. Júlia teve uma adaptação muito rápida e segura. Em pouco tempo já repetia que adorava a nova escola e os novos amigos. E são muito amigos, conquistados de uma maneira muito especial, do seu jeito.
     Como o colégio adota mesas com quatro lugares, a aproximação natural se deu com os primeiros coleguinhas. Na semana seguinte, notamos que ela mudara de mesa e de companhia. Quisemos saber as razões, temendo que houvesse algum problema. A explicação, endereçada à mãe, veio de maneira simples e objetiva, e sepultou nossas preocupações:
     - Mamãe, como eu mudei de escola, vou trocar de mesa até conhecer todos os meus novos amigos."

A páscoa de Delúbio

     Temos que reconhecer que o cabra sofreu, foi malhado como um judas de cidade do interior e suportou tudo calado, com aquele meio sorriso que acompanha seu olhar de paisagem. Não reclamou publicamente, perdeu o emprego que mantinha irregularmente na prefeitura de Goiânia (recebia para não dar aulas), foi xingado nas raras vezes em que tomou coragem de aparecer em locais públicos. Tudo em benefício da causa.
     Houve quem, em certo momento, acreditasse que ele não iria resistir e que acabaria contando o que sabia sobre o mensalão, a participação de seus chefes e líderes. Mas Delúbio Soares, o ex-contador do PT, resistiu a toda a provação. Guardou os segredos que ainda continuam oficialmente inéditos, engoliu o afastamento do partido que ajudara a se fortalecer - com o uso de dinheiro público, na parceria com o publicitário Marcos Valério - e o isolamento forçado.
     Hoje, reaparece no noticiário, abençoado pelo ex-presidente que ajudou a manter no cargo, com seu silêncio. Lula - aquele que negou o mensalão, recuou, acusou companheiros de traição e, novamente nega o inegável - vai pagar sua dívida histórica, apoiando o retorno de Delúbio aos braços do PT.
     Imagino as lágrimas, os discursos. Volta, Delúbio. Você é o PT.

A greve dos togados

     Eles são incorrigíveis, independentemente da esfera na qual atuam. Tivemos, recentemente, diversos casos de abuso de autoridade (as deletérias 'carteiradas'), arbitrariedade, crime comum, reclamações quanto ao horário de trabalho e, agora, anuncia-se, para amanhã, uma greve de 'suas excelências federais', que preferem chamar o movimento de "paralisação".
     Para adoçar o paladar do público ante esse prato azedo, nossos destemidos juízes federais alegam que vão parar para pedir mais segurança para os que agem na esfera do crime organizado e melhor estrutura de trabalho (talvez tapetes vermelhos e cascatas de água mineral nas salas de audiência). E aumento de salário? É claro que sim. Afinal, suas excelências tiveram, 'apenas', revisão de seus salários, como a quase totalidade dos trabalhadores do país. Eles querem aumento real de quase 15 por cento.
     Segundo O Globo, o Conselho da Justiça Federal ameaça descontar o dia dos grevistas de toga, que já reagiram, alegando que têm os mesmos direitos reservados a todos os cidadãos brasileiros. Nesses momentos, somos todos iguais.
     Repito, agora, a conclamação feita, há mais ou menos um  mês, quando do movimento dos juízes pelo meio expediente no verão: vão trabalhar!!!

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Viagens para a morte

     A cada feriadão - e como há feriadão no Brasil! -, uma certeza: haverá um número absurdo de mortes nas estradas. E não vejo comoção nas autoridades, nem na população em geral. É como se tudo já fizesse parte de uma grande programação macabra.
     Motoristas lotam seus carros e saem de casa sabendo que podem não voltar, numa espécie de roleta-russa sobre quatro (ou duas) rodas. Bebida, imprudência, irresponsabilidade pura e simples, falta de policiamento adequado e estradas em péssimas condições formam o quadro ideal para catástrofes.
     Segundo a Polícia Rodoviária Federal divulgou hoje à tarde, foram 175 mortos e mais de dois mil feridos em quase sete mil acidentes. São números de tragédia, tratados, irresponsavelmente, como estatística.
     A maior novidade, a julgar pela interpretação dos números feita pelos jornais e autoridades, foi a redução do total de vítimas fatais, se comparado ao do último carnaval. Grande consolo.

Uma aventura caribenha - Capítulo 9




'Nossa' balsa, sendo carregada, em Porto Velho

Sábado - 24/07/99 - Quanto mais, melhor
     Rio Madeira (23h47) - Nosso grupo, em ocasiões anteriores, mostrou que gosta de sair por aí, explorando lugares e conhecendo gente. Mas mesmo assim, todos nós tivemos um pouco de dúvida sobre a reação a bordo das balsas que nos levariam a Manaus (fomos surpreendidos pela interdição da BR-319). Afinal, essa grande travessia dos 1.050 quilômetros que nos separam da capital amazonense, mesmo a favor da corrente, deveria levar, pelo menos, quatro dias inteiros. Somava-se a isso, o fato de que seríamos os únicos passageiros (todas as demais pessoas a bordo fazem parte da tripulação).   
     Em poucas horas, no entanto, todas as nossas dúvidas foram por água abaixo. Nosso primeiro dia a bordo revelou-se insuficiente. Quando nos demos conta, já era noite. Para mim um apaixonado por futebol (aliás, o único do grupo), foi como uma daquelas partidas que a gente nem sente passar. João Carlos Nogueira definiu do seu jeito essa sensação: "O dia passou como se fosse um filme". Alexandre descobriu que havia tanta coisa para ver e sentir que não sobrou tempo para dar uma geral nos adesivos das três Dakotas. João Marcos acumulou descobertas o dia todo, em conversas com o comandante Moisés e sua tripulação.
     Ainda bem que teremos mais três dias a bordo.

A Copa do desperdício

     Certamente é uma posição antipática, que vai de encontro à da maioria. Mas, enfim, é a minha: a realização da Copa do Mundo no Brasil é um dos maiores absurdos dos últimos tempos.
     Além de o país não estar preparado para receber uma competição de dimensões continentais, o custo para equipar sedes e subsedes já se apresenta estratosférico. Não falo das obras de inferaestrutura - aeroportos, estradas, saneamento -, mas dos projetos megalomaníacos que envolvem a construção e reforma de estádios.
     Só o 'novo' Maracanã vai custar - a preços de hoje - a bagatela de R$ 1,1 bilhão. É isso mesmo: mais de um bilhão de reais. Já imaginaram o que poderia ser feito com esse dinheiro, especialmente numa cidade caótica como o Rio de Janeiro, com problemas inaceitáveis, como legiões de subfavelados, esgoto a céu aberto, trânsito infernal, um sistema de metrô ridículo e despoliciada?
     O argumento de que a competição vai necessariamente promover melhorias nas cidades é medíocre. Tudo o que está sendo feito agora, a 'toque de caixa'- que ainda é pouco - já deveria ter sido providenciado há muito tempo, em respeito à população, que paga impostos e - infelizmente - não exige, como deveria, a contrapartida.
     A tal da PPP (Parceria Público-Privada)? A prevalecer o modelo proposto para o trem de alta velocidade entre o Rio e São Paulo, nós vamos financiar quase tudo, através de tentáculos do governo.

O preço da gastança

     "Nós temos muita preocupação com a inflação. Não haverá, em hipótese alguma, desmobilização do governo diante da inflação", disse. "Todas as nossas atenções estarão voltadas para o combate acirrado à inflação", garantiu.

     As três frases, reproduzidas pelo Estadão, são da presidente Dilma Roussef. Têm o mesmo teor e, no fundo não expressaram absolutamente nada, como quase tudo o que ela diz publicamente. Todos, no mundo inteiro, são contra a inflação, preocupam-se com  ela. Muitos, infelizmente, não seguem a cartilha ideal para combater esse fantasma que normalmente coloca em em risco a estabilidade das nações e, por tabela, dos próprios governos.
     A inflação não é, apenas, o resultado de um ou outro fator, isolado. É a consequência de um  soma de atos, de políticas públicas, de sinais enviados claramente à sociedade. Tudo o que o governo anterior não fez especialmente no ano passado, quando se lançou obstinadamente na campanha pela eleição da atual presidente.
     A farra da gastança interna, em vez de ser contida, aumentou. A proposta de criar um ambiente de festa, irreal, estimulado pela expansão desenfreada do crédito, gerou uma enorme pressão em uma economia que, embora respirando sem aparelhos, ainda estava sendo afetada pela crise que domina o mundo.
     O Governo, ao mesmo tempo, ampliou seus gastos, sem lastro. As reformas não saíram do papel. Está armado o palco para um espetáculo que já conhecemos e que não gostaríamos de ver reapresentado no país.
     É bom, mesmo, que a presidente Dilma Roussef esteja atenta aos sinais que já estão chegando, mais claros a cada dia.

domingo, 24 de abril de 2011

Uma aventura caribenha - Capítulo 8


Na balsa, as picapes, com as barracas armadas sobre as caçambas

Sábado - 24/07/99 - Os Apitos de "Dona" Creusa 


     Rio Madeira, Amazônia (21h32) - Os três apitos (apitos, mesmo), no final da tarde do nosso primeiro dia a bordo da balsa que está nos levando a Manaus, já não causaram surpresa. Totalmente ambientados, sabíamos que quem estava apitando era "Dona" Creusa, a cozinheira da tripulação, chamando para o jantar. Pela manhã, vendo que não havia sido entendida pelos hóspedes inusuais, "Dona" Creusa adicionara aos apitos uma chamada verbal: "Hora do almoço", alertara. 
     A comida, simples, mas bem temperada, fez sucesso entre os quatro viajantes famintos e deslumbrados com a força e a beleza do Rio Madeira, um dos maiores do mundo - o décimo-terceiro, parece. Largo - em torno de quatrocentos metros - e com um surpreendente volume de água, especialmente para um período de seca como o que a região está passando -, o Madeira vem oferecendo a todos nós (eu, Alexandre Viana, João Carlos Nogueira e João Marcos) a oportunidade de apreciar belos espetáculos. Como o balé dos botos que por várias vezes surgiram ao lado na nossa balsa (na verdade, duas balsas empurradas pelo rebocador 'NM XXVI', da capitania dos portos de Manaus). 
     Os paredões de árvores, algumas com mais de 15 metros de altura, dão uma pequena idéia do que é a Amazônia. Quando nosso comboio passa mais perto das margens, em busca de canais de navegação mais profundos, dá para ouvir um pouco da voz da floresta. 
     De quando em vez cruzamos com outras embarcações. Pela manhã, passamos ao lado do que restou da "gaiola" (tipo de embarcação de passageiros que faz a ligação entre as cidades ribeirinhas) que naufragou semana passada. Na tentativa bem-sucedida de evitar maiores perdas, seu comandante conseguiu jogar ao barco num banco de areia a meio caminho da margem. Pelo menos uma pessoa morreu nesse acidente. Já o nosso comboio navega por águas tranquilas, conduzido na ponta dos dedos pelo comandante Moisés, formado e pós-graduado nessas águas. 
     Da ponte de comando, vai descobrindo, ao longe, os bancos de areia e as pedras que surgem no caminho. Em determinados trechos, um dos homens da tripulação mede a profundidade do rio, atirando um peso nas águas e contando as braças (cada braça mede dois metros). "Nossa margem de segurança é uma braça e meia. Menos que isso a balsa pode arrastar no fundo", explica, didaticamente.

Uma ameaça à igualdade

     Um levantamento realizado pela revista Veja mostra que 11 governadores eleitos em outubro passado (*) podem perder os mandatos, acusados que são de alguns crimes eleitorais, entre eles o 'abuso de poder político e econômico', o 'uso indevido de meios de comunicação' e 'compra de votos'. Seria cômico, se não fosse ridículo.
     Nenhum deles, e há políticos para todos os gostos, cometeu tantos crimes, tão seguidamente, e demonstrou tanto menoscabo com a Justiça do que o ex-presidente, no seu afã de eleger o sucessor a qualquer preço, tarefa que conseguiu, com certa folga.
     A eleição passada talvez tenha sido a mais conspurcada da nossa história, pela participação deletéria e, sim, criminosa, do presidente da República de então, que não se limitou ao aceitável apoio ao seu candidato. Ao contrário, Lula mergulhou num mar de ilicitudes eleitorais jamais visto, usando e abusando do dinheiro público e do seu prestígio  - que é inegável, embora incompreensível -, sabendo-se acima do bem e do mal.
     Mentiu, distorceu fatos, fabricou inaugurações de pedras fundamentais, trabalhou como cabo eleitoral 24 horas por dia, sete dias por semana, num desprezo total pela liturgia do cargo. Nenhum dos atuais dirigentes foi tão beneficiado por crimes eleitorais quanto a atual presidente, Dilma Roussef, obrigada a 'pagar' multinhas de R$ 5 mil.
     A cassação de governadores, pelos crimes apontados, independentemente do partido de origem, seria aceitável e altamente moralizadora caso a legislação fosse aplicada literalmente, sem olhar o acusado. Como está posta, essa ameaça é uma afronta a um regime que, em tese, é igual para todos.
  
(*) Governadores ameaçados:  Wilson Martins (PSB), do Piauí; Siqueira Campos (PSDB), do Tocantins; Rosalba Ciarlini (DEM), do Rio Grande do Norte; Omar Aziz (PMN), do Amazonas; Cid Gomes (PSB), do Ceará; Teotônio Vilela (PSDB), de Alagoas; Antonio Anastasia (PSDB), de Minas Gerais; Tião Viana (PT), do Acre;  Roseana Sarney (PMDB), do Maranhão; Silval Barbosa (PMDB), de Mato Grosso; e José Anchieta Júnior (PSDB) de Roraima.

sábado, 23 de abril de 2011

País de promessas não cumpridas

     Vivemos plenamente a época dos factoides, inaugurada há pouco mais de oito anos. De um milhão de casas populares anunciadas com estardalhaço pelo governo anterior, mal foram construídas 200 mil, muitas das quais desabaram, estão desabando ou vão desabar a qualquer momento. Mesmo assim, durante a campanha do ano passado, a então candidata Dilma Roussef anunciou mais dois milhões de unidades residenciais.
     Para quem mal cumpriu, em oito anos, 20% do que foi anunciado para ficar pronto em quatro,  uma promessa a mais não faz a menor diferença. Ninguém vai lembrar, nem cobrar. Basta manter o pagamento das bolsas em dia, financiar sindicatos, federações e confederações e distribuir um bom churrasquinho para os profissionais da invasão do MST.
     Os demais exemplos estão aí, dos quais a autossuficiência em petróleo é o mais gritante. Vendida à população como um grande feito, a redenção do Brasil, em nada mudou o dia-a-dia do brasileiro que vai aos postos. A gasolina, que, afinal, seria toda verde-e-amarela, sobe de preço a cada tiro disparado no Oriente Médio. O álcool, apresentado como a grande contribuição brasileira aos esforços pela melhoria da qualidade do ar que respiramos, virou um pesadelo. O diesel continua como antes: importado e subsidiado.
     Sendo assim, nada mais fácil do que uma promessinha a mais, como a feita ontem, de treinar e formar 3,5 milhões de trabalhadores, para suprir nossas carências de mão-de-obra qualificada. O resultado já foi alcançado: manchete nos jornais.

Justiça atira no próprio pé

     O tiro no pé de um juiz, em Juiz de Fora, disparado por um PM, após discussão de trânsito (publicado em O Globo), é mais do que uma ocorrência criminal. É sintomático e - ouso - emblemático. A incidência de casos envolvendo suas excelências, em todos os cantos do país, revela, no mínimo, a falta de preparo de grande parte dos atuais magistrados, guindados às Cortes após testes objetivos de conhecimentos da Lei, mas não de vida.
     A sensação de inimputabilidade, de onipotência, vem se ampliando exponencialmente, costeando, em muitos casos, o fronteira da inconsequência. A toga, historicamente, é um símbolo de equanimidade, lógica, conhecimento, extrema humanidade. Como vem sendo usada em diversas e repetidas ocasiões, mais se assemelha a um escudo contra tudo e todos, uma peça de vestuário capaz de encobrir privilégios e atitudes prepotentes de quem não deveria estar acima da lei, mas a serviço dela.
     Esses episódios lamentáveis de magistrados envolvidos em mesquinhas demonstrações de poder, infelizmente, somam-se a outras evidências de distanciamento da própria essência da função, como as manifestações contra o trabalho em tempo integral e os constantes e absurdos recessos.
    A cada dia, constata-se, os três poderes mais se assemelham, no que há de pior.

Não há bons ditadores

     O desenrolar da enorme crise no Oriente Médio e norte da África aponta para novas e contundentes constatações, entre elas uma que eu me permito destacar: não há bons ditadores. Bashar Assad, o número um da Síria, herdeiro da cadeira 'presidencial', é, hoje, o maior exemplo de que o mundo livre não deve ser complacente com esses líderes que se julgam eleitos por algo divino e, por isso, acima do bem e do mal.
     De uma dezena de mortes para outra, descobrimos que o sírio Assad não é um  milímetro menos ruim do que o líbio Muamar Kadafi que, por sua vez, não se difere de outros genocidas africanos, semelhantes a ele em crueldade e arrogância.
     A cada exemplo de violência contra o próprio país, em nome - ou na falta - de causas, mais fica claro que o grande remédio para o mundo ainda é a democracia. Apesar de todos os seus defeitos e distorções, ainda não foi inventado outro regime que garanta aos povos o direito à escolha de seus caminhos, em ordem e dentro da lei.
     Figuras messiânicas, como Kadafi; aprendizes de feiticeiros, como Hugo Chavez; ou demagogos populistas, como Lula; são nefastas, ao tentarem encarnar a vontade da população, com base apenas nos seus próprios e quase sempre limitados horizontes.

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Vândalos uniformizados

     A estupidez de um grupo de torcedores do Botafogo não tem desculpas. Com a arrogância dos que se sabem acima das leis, algo em torno de 15 vândalos (segundo o jornal O Globo) cercaram, ameaçaram e chegaram a agredir jogadores do clube, na chegada ao Rio, depois da eliminação na Copa do Brasil.
     A reação dos policiais e dos seguranças particulares do clube foi absolutamente tímida. Ao que parece, ninguém - em especial as pessoas ligadas ao clube - tem coragem de enfrentar esses marginais, que se acham no direito de - em nome de uma paixão - atropelar os limites da razão.
     Infelizmente, essa atitude não é um fato isolado. Recentemente, em São Paulo, assistimos a atos de vandalismo de torcedores corintianos, responsáveis, em última instância, pela antecipação do fim da carreira de Ronaldo. Aqui no Rio, a esfuziante torcida tricolor já foi a responsável pela quebra de muitos vitrais das sede de Laranjeiras.
     Vascaínos, há pouco tempo, exibiram seu potencial de irracionalidade, chegando a destruir carros de jogadores. Na Gávea, ainda não cicatrizaram as feridas deixadas por desajustados que provocaram um enorme transtorno na chegada do time ao Rio, no Aeroporto Santos Dumont, há alguns campeonatos brasileiros.
     Por trás de todos esses incidentes, mais do que a paixão irrefletida, está a conivência absurda de dirigentes com bandos organizados, que a cada ano se sentem mais fortes, inimputáveis e decisivos no dia-a-dia, através da participação direta na política dos clubes.

Uma aventura caribenha - Capítulo 7


Um pôr-do-sol sensacional, no Rio Madeira


Sexta Feira, 23 de julho de 1999 - Todos a bordo 

     Porto Velho (23h11) - Finalmente embarcamos na balsa que nos levará a Manaus através do Rio Madeira, um dos mais importantes afluentes do Amazonas. A aventura pela BR-319 ficou para outra oportunidade. Segundo informações aqui da cidade, o Quinto Batalhão de Engenharia do Exército promete recuperar as pontes (derrubadas por uma enchente inesperada) até março do ano que vem.
     A balsa - na verdade 'as balsas', pois são duas (cerca de 100 metros de comprimento), impulsionadas por um empurrador – esta literalmente tomada por contêineres, empilhados em dois andares. O carregamento foi lento, num processo bem marcado e delimitado por normas simples de segurança.
     Nossos três veículos ocupam uma grande área no final da segunda balsa, bem próximos do empurrador, o NM XXVI, que conta com uma tripulação de oito pessoas, incluindo uma cozinheira. Todos foram muito gentis, procurando nos deixar à vontade, já que somos os únicos passageiros.
     No final da tarde, enquanto curtíamos nosso primeiro pôr-do-sol a bordo, aguardando o fim do carregamento, tivemos o primeiro contato com a fauna do Rio Madeira: um cardume de botos rodeou nossa balsa, certamente atraído por peixes menores que aproveitavam a sobra dos grãos que caíam na água (o terminal onde embarcamos funciona, também, como graneleiro).
     Nossa balsa só deve zarpar ao amanhecer, por segurança. O Rio Madeira, nessa época do ano, está muito baixo e é preciso muita atenção para contornar bancos de areia e pontas de pedras.
     Antes de armar nossas barracas, montadas, estrategicamente, sobre as caçambas das picapes, comemoramos o embarque com um farto lanche regado a vinho. A aventura continua.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Arroubos ideológicos

     Leio, na Folha, que a presidente Dilma Roussef comparou os inconfidentes mineiros aos que lutaram contra o regime militar instituído em 1964. Deveria ter ficado calada, ou não se deixar levar por arroubos ideológicos que não se sustentam face a uma avaliação que não seja engajada, maniqueísta.
     Os primeiros - os mineiros de 1789 - lutaram pela independência do Brasil, embora a grande motivação, o estopim da revolta, sabe-se, tenha sido a 'gula' excessiva da Coroa Portuguesa, que culminaria no episódio que a história relata como a 'derrama'.
     Já os ex-companheiros da atual presidente, que combateram o regime ditatorial, pregavam, não 'apenas' a derrubada de um governo ilegal - como é o da Líbia, por exemplo -, o que seria justificável, mas a adesão a um ideário que passava longe da liberdade, montado, exatamente, sobre ilegalidades, supressão de direitos, perseguições, assassinatos em massa.
     É claro que havia jovens apenas e tão-somente idealistas entre os que foram presos, torturados e mortos.  Mas, pairando sobre eles, estava uma visão do mundo que se mostrou deturpada e foi derrubada logo depois pela própria história, junto com o Muro de Berlim.

A vitória do 'Sul maravilha'

     Para mim, que assisti ao jogo com o distanciamento possível a um vascaíno apaixonado, o grande momento do empate entre o Avaí, de Santa Catarina, e o carioca Botafogo não foi o pênalti 'descoberto' por sua senhoria, de quem não me recordo o nome, e que tirou o alvinegro da Copa do Brasil. Também não foi o misto de destempero e alucinação de um jogador que, não por acaso, é conhecido como Loco Abreu. Para mim, o destaque absoluto desse espetáculo futebolístico foi a entrevista do meio-campo Marcelo Matos, ao fim da partida e da batalha campal que se seguiu ao encerramento do jogo.
     Marcelo simplesmente atribuiu a desclassificação a um complô dos estados do Sul (notadamente Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), aos quais acusa de uma irreversível tendência separatista.
     - Os caras nem querem ficar no Brasil e ainda colocaram um juiz gaúcho para apitar no Rio (2 a 2). Aqui é tudo igual, é a mesma coisa", bradou, indignado, remoendo o passado e apresentando-o como atual.
     Para Marcelo, e isso ficou claro nas suas palavras, o Sul - uma espécie de país à parte - sempre estará unido contra tudo e contra todos. O Botafogo teria sido apenas mais uma vítima desse sentimento nacionalista-separatista.
     O desabafo de Marcelo - embora equivocado, mostrou ter noções históricas - me remeteu a outro, discriminatório, feito por Edmundo, após uma atuação desastrosa de um juiz nordestino num jogo do Vasco em Alagoas, se não me falha a memória. Inconformado com o mau resultado e destemperado, não fez por menos:
     - Não poderia dar outra coisa. Botaram um 'paraíba' para apitar aqui ...", explodiu, sem pensar, como era de hábito.

Lula e Maluf, tudo a ver

     O indefectível ex-presidente voltou a atacar, em entrevista à independente TV CUT. Segundo a Folha, o 'doutor' Lula atacou - é claro - o PSDB, acusando-o, entre outras coisas, de não ter uma identidade política, fazer alianças à direita e de abrigar correntes distintas, que lutariam pelo poder. Aos mais desavisados, poderia parecer que estava fazendo uma avaliação do PT, em especial o paulista, mais forte e significativo, embora permanentemente derrotado nas eleições locais.
     Acostumado a falar bobagens sem ser contestado, seguiu em frente, antecipou uma investida no que ele teria chamado de 'órfãos do malufismo e do quercismo' e lembrou o sucesso de sua parceria com o ex-vice José Alencar. Nada mais puro ideologicamente do que isso.
     Os defeitos apontados nos adversários, como por encanto, transformam-se em virtudes. A busca de alianças, por mais promíscuas e vagabundas, é apresentada como um exemplo de sensibilidade política.
     Esse é o Lula verdadeiro, o mentiroso, o falastrão histriônico.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Afinal, somos, ou não, autossuficientes?

     Para evitar surpresas, acho que é melhor admitir que o pior. O ministro da Fazendo, Guido Mantega, garantiu que não vai haver falta de gasolina nos postos de abastecimento, contrariando um executivo da Petrobras, que havia sugerido o contrário. Quando Mantega diz ou pensa alguma coisa, é possível sentir o cheiro de longe.
     Mas é até provável que não haja problemas graves no abastecimento, apesar da incompreensível e deletéria crise no fornecimento de álcool, combustível que, além de ser vendido separadamente, é misturado obrigatoriamente à gasolina (até 25%). Seria uma confissão pública da incompetência presumida.
     O desabastecimento de combustível, justamente num país que se diz autossuficiente na produção de petróleo e se apresenta ao mundo como o inventor da alternativa ao combustível fóssil, seria uma arma invejável na mão de uma oposição que tateia em busca de uma causa, qualquer uma.
     Já basta o estraga causado pelos preços abusivos cobrados pelo álcool e pela gasolina. Eles,  por si só, expõem claramente que há algo de muito ruim no ar, além dos monóxido de carbono expelido pelos canos de descarga.

Uma aventura caribenha - Capítulo 6

Sexta-feira - 23/07/99 - Expedição troca a estrada pelo rio

     Porto Velho - Foram 1.035 quilômetros de estrada (da cidadezinha de Pontes e Lacerda até Porto Velho) e uma surpresa não muito agradável: a BR-319, que liga (?) a capital de Rondônia a Manaus está interditada. Não apenas difícil, alagada ou coisa semelhante, está fechada, mesmo. A notícia, que nos foi passada no posto de abastecimento na entrada da cidade, foi confirmada pelas polícias rodoviárias de Rondônia e do Amazonas, contatadas por João Carlos Nogueira.
     Algumas pontes de madeira cederam e não há como fazer a travessia de alguns rios. Manaus, só de balsa, pelo Rio Madeira, um dos afluentes do Amazonas. "E é bom andar rápido, pois vai sair uma balsa de madrugada", alertou nosso informante.
     Acabamos de jantar ali mesmo, no restaurante do posto, e seguimos para o porto. A balsa estava lá, pronta para zarpar às 4 horas da madrugada. Só que já estava lotada. Uma carreta acabara de ocupar o espaço que, em tese, estava reservado para nós. Alexandre Viana ainda tentou negociar com o encarregado do porto, mas não adiantou.
     Outra balsa, só amanhã, sexta-feira. Fica, pelo menos, a promessa de quatro dias - é, isso mesmo, são quatro (ou cinco) dias  de Porto Velho a Manaus - de emoções diferentes. O guarda rodoviário que nos informou sobre o fechamento da estrada garantiu que o passeio vale a pena pela beleza das paisagens. Vamos conferir

A folgança de 'suas excelências'

     Há alguns dias, a vergonhosa reação dos nossos juízes (alguns dos mais bem-pagos e paparicados funcionários públicos do país), inconformados com a obrigação de trabalhar como todos os demais mortais, mereceu o repúdio da sociedade. Os argumentos de alguns, quer chegaram a apontar o calor como um fator de impedimento, chegou a soar como deboche de uma classe que não dá dois passos em ambientes sem ar-condicionado.
     Hoje, a Folha nos brinda com a informação de que o feriadão (de quinta a domingo) já começou para suas excelências e servidores judiciais de Minas, Alagoas, Tocantins, Goiás, Maranhão, Roraima, Amapá e do Distrito Federal. Segundo esses ETs, o folgão antecipado está previsto em lei nessas unidades da Federação.
     E esse desrespeito à cidadania não fica apenas por aí: não há expediente, também, no Supremo Tribunal Federal, no Superior Tribunal de Justiça, no Conselho Nacional de Justiça e na Justiça Federal. A folgança estaria amparada em lei de 1966.
     Enquanto isso, centenas de milhares de processos se acumulam por toda a parte, em todas as instâncias, prejudicando a vida de milhões de pessoas, provocando insegurança e instabilidade jurídicas.

O que a gente vê na tevê

     Abaixo, três notinhas sobre temas televisivos, extraídas dos momentos passados recentemente em frente à telinha. Vamos a eles:
     1 - Se eu fosse - digamos - um  site de avaliações especializado em séries televisivas, diria que Covert Affairs (AXN, terças, às 21 horas) ainda está sob observação. Numa escala de 0 a 5, hoje, ficaria com 1,5, por aí. Até que a atriz principal,  Piper Perabo, que representa uma jovem agente da CIA, não é das piores, apesar de abusar de caras e bocas. Mas é difícil engolir que ela, com seus 50 quilos de pele e osso, enfrente alguns trodloditas de 120 quilos usando, apenas as mãos. Tudo bem, é cinema, diversão. Mas existe um limite entre a fantasia e o ridículo.
     2 - O SporTV completou ontem dois dias de luto, lamentações e dor pelo pênalti perdido por Ronaldinho Gaúcho, domingo, no último minuto da partida em que o Flamengo empatou (1 a 1) com o Macaé. O fato de a penalidade não ter existido (assim como a marcada a favor do Vasco, na partida com o Olaria) foi convenientemente colocado para escanteio. Eram visíveis o sofrimento, as tentativas de desculpar o atleta (desnecessárias, que fique claro), os elogios à sua determinação em campo, à sua entrega. E, ilustrando a exibição explícita de corações partidos, a repetição, à exaustão, do gol que garantiu o título da Taça Guanabara. Tudo isso temperado, como de hábito, com incontáveis "taria", "teve" e "tiveram".
     3 - Sempre que escuto o comentarista de arbitragem José Roberto Wright, da Globo, contestar a marcação - ou a não marcação - de um pênalti (como no último jogo entre o Vasco e o Olaria), sou irremediavelmente atirado em uma máquina do tempo que me leva à decisão do campeonato carioca de 1985, entre Bangu e Fluminense, vencido pelo tricolor, graças a um dos maiores erros da história do futebol: no último minuto do jogo, o atacante Cláudio Adão, do Bangu, dribla o zagueiro Vica entra na área e, quando se preparava para chutar, é derrubado. Pênalti claro, transparente, inquestionável. O juiz chega a apitar mas, inexplicavelmente, após alguns segundos de perplexidade, termina o jogo. Flu tricampeão. Quem era o tal árbitro? Ele mesmo, José Roberto, representante de uma família de ilustres tricolores.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Andando com porcos

     Minha mãe, quando queria criticar algumas de minhas companhias juvenis que não passavam no seu crivo, costumava dizer, repetindo o que ouvia do pai: "Quem anda com porcos come farelos". Se a mim fosse permitido, seria justamente a frase que eu despejaria nos ouvidos dos dirigentes de partidos cujos integrantes trocam de legenda sempre que a oferta é mais consistente.
     Não há o que reclamar, cobrar ou coisa que o valha. Em quase todos esses episódios de descaramento político explícito, não há mocinhos e bandidos. Há, sim, personagens investindo em ambições pessoais, desprovidas de qualquer vestígio de ideologia.
     Não há luta pela afirmação de princípios, de rigidez, de compromissos públicos. Ao contrário. O objetivo é tirar vantagem de um momento. E os partidos sabem disso. Conhecem bem seus integrantes. E os usam para ampliar a fatia do bolo maior que querem devorar. Ou alguém acredita que o caráter político do prefeito Gilberto Kassab, por exemplo, mudou com o tempo, 'evoluiu' do DEM para o recém-criado PSD. Ou - vá lá - involuiu.
     Coerência, mesmo, só encontro nos integrantes de uma agremiação política, o onipresente PMDB. Esses, sim, não mudaram. Continuam os mesmos, fiéis ao governo de plantão, ocupando os primeiro, segundo, terceiro e demais escalões. Com eles não há essa tal de infelidade partidária, essa corrida ao mais vergonhoso quem dá mais. Eles sempre conseguem tudo, do bom e do melhor, independentemente do matiz dos poderosos. São o exemplo cuspido e escarrado da política brasileira.

O doutor ataca outra vez

     Agora é oficial: o novo doutor da Universidade de Coimbra anuncia sua disposição de voltar aos palanques para ajudar seus comparsas nas eleições de 2012. Na verdade, ele jamais saiu dos refletores. Deu um tempinho, nos primeiros dias de Dilma Roussef na presidência, e foi à luta, cometendo as bobagens de sempre, sob um novo ângulo, é verdade: palestras pelas quais recebe algo em torno de R$ 200 mil.
     É isso mesmo. Há quem pague, e muito bem, para ouvir o ex-presidente dizer as batatadas de sempre, com aquela expressão de inteligência e superioridade comum aos exemplares que meu sogro batizava, muito bem, de 'analfabestas', numa referência a um agregado da família que destilava ignorância por todos os cantos da casa.
     A favor da nossa sanidade mental e higiênica, o fato de seus (dele, Lula) discursos e platitudes já não repercutirem com a mesma intensidade, invadindo os espaços de telejornais. Certamente sempre vai conseguir minutos extras nos canais do ex-banqueiro Sílvio Santos e do tal bispo. Mas esses estão bloqueados indefinidamente na minha casa.

O Ronaldinho dos Castros

     Na Veja, uma foto que, por si só, confirma a promessa de 'renovação' dos dirigentes cubanos, apregoada pelo presidente da ilha e do Partido Comunista: Fidel, abatido definitivamente de todos os poderes, entrega um envelope ao jovem Raúl Rodrígues Castro, neto do agora absoluto Raúl Castro e seu guarda-costas. No envelope, segundo as agências de notícias, estaria a renúncia formal de Fidel à presidência do PCC e a cédula com os votos destinados às eleições realizadas no Congresso do PCC.
     A tal renovação, a julgar pela foto, pode estar a caminho, num processo que eventualmente alçaria o jovem guarda-costas à cúpula do poder, gradualmente. A história recente das ditaduras espalhadas pelo mundo mostra a tendência às mudanças que deixam tudo no mesmo lugar. Sai um velho tirano, assume um tirano jovem, parente direto, sangue do mesmo sangue. Foi assim na Coreia do Norte, na Síria. Ou, num máximo de abertura, o general que dava sustentação ao regime, como aconteceu recentemente no Egito.

A renovação cubana

     O Partido Comunista Cubana tem 'novo' presidente. Saiu Fidel (84 anos), na função desde 1965, e entrou seu irmão, Raúl Castro, o menino de 79 anos que também é o presidente de Cuba, esse enclave do atraso no Caribe.Tudo 'bem de acordo' com o discurso de Raúl, na abertura do 6º Congresso doPCC. Na ocasião, ele defendeu a 'renovação' dos dirigentes, para que o regime de adaptasse ao mundo moderno.
     Ao lado de Fidel, que abriu mão do poder há quatro anos, quando ficou gravemente enfermo, Raúl anunciou reformas, entre elas, uma novidade que tem potencial para mudar os conceitos de economia do mundo: as pessoas vão poder comprar e vender imóveis. Não há mais dúvida. A modernidade chegou a Cuba.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Entre o hambúrguer e a cannabis

     Ambos são deputados federais de partidos da base do governo, um eleito pelos fluminenses; o outro pelos paulistas. O primeiro, Jair Bolsonaro, do PP, foi merecidamente estraçalhado por ter feito declarações racistas e homofóbicas, passíveis de processo, por ferirem a Constituição. Imprensado - literalmente -, tentou explicar o inexplicável, procurou sair pela tangente e exibiu o cunhado negro como prova maior de que não poderia ser racista.    
     Já o outro, um tal de Paulo Teixeira, líder do ... PT, é claro, vem encontrando defensores, mesmo tendo afrontado a lei, ao defender a liberação do plantio e consumo de maconha, uma inegável e criminosa postura de apologia ao crime (não podemos esquecer que a venda de drogas ainda é ilegal por essas bandas). Uma posição que contraria - pelo menos oficialmente - a do próprio governo que ele representa na Câmara.
     Um de seus argumentos para defender a maconha, segundo palestra gravada, seria a liberdade que as pessoas têm para comer um sanduíche do McDonalds. É isso mesmo. Se eu posso comer um cheesebúrguer, meu vizinho pode plantar, consumir e negociar seu baseado. Ou, quem sabe?, socializar uma carreirinha ...
     Ao contrário do racista, que voltou ao programa humorístico CQC (Bandeirantes, segundas, 22h30) para desdizer o que dissera, o petista, segundo a Folha, sumiu de circulação desde que seus ... 'pensamentos' se tornaram públicos.
     Temos, aqui, dois casos de afronta à lei. Um criminoso, por ser de esquerda (seja lá o que isso for), merece todos os benefícios da liberdade de expressão. Ao outro, direitista assumido, reservaram-se as críticas mais rigorosas. Sinais dos tempos.

Lobão morde e não sopra

     Quem me conhece minimante sabe que eu estou bem longe de me colocar entre os fãs da música do roqueiro Lobão. Ao contrário. Portanto, me considero absolutamente isento para afirmar que a entrevista que ele deu ao Manhattan Connection ontem (Globo News, domingos, às 23 horas) foi um dos melhores momentos do programa nos últimos tempos. A irreverência inteligente de Lobão não perdoou, em especial, Chico Buarque, o maior nome da MPB, uma espécie de Lula das artes - pelo carisma, que conquista quase todos, e não pela falta de cultura.
     O trecho em que ele relembrou a paixão simultânea da mãe pelos olhos azuis do ex-presidente Garrastazu Médici e de Chico foi emblemático. Gil e Caetano também não escaparam das ironias do cantor, que está em campanha de divulgação de seu livro de memórias, que contempla 50 anos de vida.

Uma aventura caribenha - Capítulo 5

Quinta-feira - 22/07/99 - Um patriarca e seus 'causos'

     Cuiabá - A terça-feira, que parecia perdida, ainda mais depois de um dia inteiro na Transpantaneira, revelou-se extremamente agradável. As normalmente tediosas horas gastas à espera da revisão de um de nossos veícuklos (estamos seguindo rigorosamente às indicações do manual) nos revelaram um personagem absolutamente interessante, 'seu' Piccinin, um misto de fazendeiro e dono de concessionárias (tem uma revenda Chrysler e outra da Mazda), patriarca de uma família capaz de fechar, sozinha, um restaurante, de preferência italiano (são oito filhos e 26 netos).
     Aos 72 anos, ele mantém os hábitos de quando começou a vida, no interior de São Paulo, trabalhando na lavoura, ajudando os pais, imigrantes italianos. Diz que um dos segredos de seu sucesso é dormir com o sol e acordar com ele.
     Um bom par de horas de conversa e já estávamos conquistados pelos seus "causos". Sabíamos, por exemplo, que 'seu Piccinin' é capaz de calcular com precisão absoluta o peso de um boi, ou quantos quilos de banha vai produzir um porco "só com o olhar", conta, vaidoso. Ao lado, um dos filhos confirma, sorridente: "Erra por meio quilo, no máximo".
      Finda a revisão (fomos obrigados, apenas, a trocar o filtro de ar, sacrificado pela poeira da Transpantaneira), seguimos rumo a Vilhena, no meio do caminho para Porto Velho, e foi aí que tivemos o segundo e inesperado encontro do dia: assistimos, na BR-174, a um pôr-do-sol de cinema, literalmente. Foram dez minutos de espetáculo à nossa frente. Afinal, nosso destino era o Oeste.

Choque de vergonha na cara

     Anuncia-se, agora, que a Tijuca será alvo de um choque de ordem ininterrupto. De repente, os governantes descobriram que não se pode conviver, com um mínimo de dignidade, com a ocupação irregular de calçadas por carros, camelôs, barraquinhas de convites a doenças intestinais, mendigos e meninos cheirando cola; assaltantes travestidos de guardadores de carro; e achaques em sinais luminosos.
     Presume-se, então, que o bairro vai ingressar em novos tempos, resgatando a paz perdida há um bom par de décadas. Isso, no entanto, é a exceção em uma cidade movida a faz-de-conta. Madureira e Campo Grande, para dar apenas dois exemplos suburbanos, mal sobrevivem ao caos que tomou conta de suas ruas. No Centro, é impossível circular sem riscos depois das seis da tarde. A Cinelândia transformou-se num escândalo a céu aberto.
     Na orla, tão decantada, impera o desrespeito. São barraqueiros, vendedores ilegais, cães, motos e bicicletas disputando o mesmo espaço. Legiões de deserdados ocupam portas de bancos e a sombra de marquises.
     E, em toda a parte, inimputáveis como deputados mensaleiros do PT, os abomináveis flanelinhas, atacando em matilhas, ameaçando, extorquindo. Tudo isso está por aí, a todo momento, aguardando por um choque de vergonha na cara nos gabinetes municipais e estaduais.

Políticos e mentirosos

     O senador Aécio Neves (PSDB-MG) insiste em ofender a nossa inteligência, alegando, através da sua assessoria, que não se recusou a fazer o teste de alcoolemia, na madrugada de domingo, quando foi parado em uma blitz da Lei Seca, na Zona Sul do Rio de Janeiro. Diz ele que não foi preciso fazer, já que convocou um motorista para conduzir seu carro, ao ser advertido que sua habilitação estava vencida.
     Com essa desculpa esfarrapada, desfeita pelos agentes do Departamento de Trânsito, Aécio nos permite presumir que acrescenta outro pecado - o da mentira - aos outros dois (falta de habilitação e dirigir após ter ingerido bebidas alcoólicas).
     Seria muito mais digno se assumisse a dupla falta e aceitasse o cartão amarelo. Temendo um eventual cartão vermelho, agiu como um João Paulo Cunha (PT-SP) qualquer, que inventou três ou quatro mentiras para explicar o inexplicável: o recebimento de dinheiro ilícito proveniente do esquema de mensalão desenvolvido pelo publicitário Marcos Valério e seus comparsas do primeiro Governo Lula.
     Para um candidato a candidato à presidência da República, Aécio exibiu um comportamento, no mínimo, reprovável, igualando-se a um transgressor comum. Ao insistir na mentira, perde o direito de cobrar verdades. Mentiroso de sucesso absoluto, no Brasil, só mesmo o fenomenal ex-presidente Lula, capaz de se desdizer a cada minuto, negar o que afirmara pouco antes, inventar e iludir sem dores na consciência, como um perfeito exemplar de sociopata político.

domingo, 17 de abril de 2011

Emoções na China

     Só para não deixar passar sem registro: a vitória do inglês Lewis Hamilton (McLaren) deu nova emoção à Fórmula Um. Uma eventual terceira vitória seguida do atual campeão, Sebastian Vettel (RBR-Renault), que ficou em segundo lugar na prova e manteve uma ainda folgada liderança geral, reduziria um tempero fundamental à competição: a incerteza. Afinal, não devem ser muitos os que se propõem a assistir a uma disputa sabendo, de antemão, o resultado.
     Outro ponto positivo do GP da China, que teve momentos de muita emoção: a evidente melhora dos carros da Ferrari e, em especial, do desempenho de Felipe Massa, que lidera, até agora, o campeonato particular que mantém com o espanhol Fernando Alonso.

Aécio não passa no teste

     Começa mal o senador Aécio Neves. Segundo O Globo, o virtual candidato do PSDB nas próximas eleições presidenciais, parado em uma blitz da Lei Seca, na Zona Sul do Rio, se recusou a fazer o teste do bafômetro e ainda estava com a carteira de habilitação vencida.
     Para quem pretende se apresentar como opção de seriedade aos desmandos éticos perpetrados pelo PT e comparsas nos últimos oito anos, foi uma atitude, no mínimo, inconsequente, uma tentativa de fugir à responsabilidade - ou evitar a constatação de sua irresponsabilidade.
     Se tinha medo de ser confirmada dosagem excessiva de álcool no organismo, não deveria estar ao volante. Aliás, não poderia, mesmo, pois a habilitação estava vencida.
     Independentemente de qualquer outro julgamento, a atitude de Aécio ocorre justamente quando o Brasil admite que as mortes no trânsito estão aumentando progressivamente, a maioria absoluta causada por motoristas irresponsáveis.
     A seu 'favor', apenas a constatação de que esse comportamento - a recusa em colaborar com os fiscais - vem sendo a norma entre os famosos e ricos (não necessariamente nessa ordem), para os quais uma multazinha de quase R$ 1 mil não faz a menor diferença no fim do mês.

A ilha da fantasia

     Cuba, um dos enclaves do obscurantismo no Caribe (o outro é, certamente, a Venezuela do bufão Hugo Chavez) encenou mais um episódio da comédia pastelão em que se transformou o país. Sob a liderança de Raul Castro, realizou-se o 6º Congresso do Partido Comunista Cubano. Só pelo título dá para sentir o cheiro de naftalina, o bolor.
     Se o tal PC cubano ainda tivesse o - digamos - pragmatismo do similar chinês, que vem sabendo administrar a 'ideologia', a ilha dos irmãos Castro poderia ter alguma chance de, finalmente, reentrar no século 20, para se habilitar - com o tempo - ao 21. Como está, e com as anunciadas mudanças para o mesmo lugar, Cuba continuará na lista dos países mais medíocres do mundo, vivendo de factóides lançados para enganar uma população restrita aos limites permitidos pelo governo.
     Se Miami sucumbisse a uma hecatombe, Cuba desapareceria ao mesmo tempo, incapaz de sobreviver sem os dólares que são enviados à ilha.
     Pobre, desinformado (não há jornais, tevê e internet livres na ilha) e submetido a lavagens cerebrais, o povo cubano assistiu a mais um espetáculo vazio, num Congresso lotado de delegados chapa-branca, que aplaudem na hora certa, como fãs de auditório comandados por um animador que manipula cartazes com as reações esperadas a cada momento.
     Finalizando o lamentável espetáculo, um caro desfile de tropas em comemoração à vitória de uma guerra contra os Estados Unidos. É isso mesmo. Eles, os dirigentes cubanos, transformam uma ridícula tentativa de invasão da Baía dos Porcos, por um grupo de cubanos descontentes, numa derrota do exército americano. E há quem acredite.

sábado, 16 de abril de 2011

Uma aventura caribenha - Capítulo 4



Terça Feira - 20/07/99 - O despertar de um ninhal

     Poconé - Mato Grosso - Nosso dia na Rodovia Transpantaneira, uma deslumbrante estrada-parque cravada no coração do Brasil, começou cedo na segunda-feira. Às cinco horas da manhã já estávamos acordados, nos preparando para uma inesquecível alvorada pantaneira. Às cinco e meia, nosso grupo (que ganhou a presença do repórter Anderson Vieira, nosso convidado, do Jornal do Brasil), acomodou-se no pequeno barco a motor que nos apresentaria a um espetáculo realmente inesquecível: o despertar de um ninhal às margens do Rio Pixaim, afluente do Cuiabá, que dá nome à capital do estado.
      Ainda na escuridão, a grande árvore que serve de pouso a milhares de aves começou a se destacar. De longe já se avistava uma multidão de pássaros adormecidos.
     Assim que o  sol começou a aparecer, tudo mudou. O silêncio foi substituído por uma algazarra impressionante. Aos poucos, centenas de aves levantavam vôo, num processo de decolagens que levou, pelo menos, dez minutos.
     De volta aos carros, chegava a hora de seguir pela estrada que leva a Porto Jofre, às margens do Rio Cuiabá, final da Transpantaneira. Pelo caminho, dezenas de pontes (algumas em péssimo estado de conservação, garantia de adrenalina) e uma variedade animal impressionante, ao alcance até mesmo da mais simplória xereta. É verdade: houve momentos em que chegamos a ficar a pouco mais de um metro de famílias inteiras de jacarés.
     Nosso próximo destino é Porto Velho, capital de Rondônia, distante 1.500 quilômetros de Cuiabá.

O novo alemão voador

     O alemão Sebastian Vettel, atual campeão mundial, ao que tudo indica, tem tudo para , ao menos, tentar repetir o fenômeno Michael Schumacher, sete vezes campeão do mundo. Três provas e três poles. Nas duas primeiras corridas, vitórias incontestáveis. O carro da RBR-Renault ajuda, é claro. Mas seu companheiro de time, Mark Webber, ficou apenas num medíocre 18º lugar, depois de muitas falhas nas tomadas de tempo para o grid de largada.
     Para quem gosta de velocidade, o GP da China, na madrugada desse domingo, deve reservar muitas emoções. Os dois pilotos da McLaren (Jesson Button e Lewis Hamilton, campeões, respectivamente, em 2008 e 2009) vêm logo atrás, seguidos pelo veloz Nico Rosberg, da Mercedes.
     A favor de Vettel,além das suas inegáveis qualidades como piloto, o fato de seu carro estar melhorando a cada prova.

As bizarrices do ministro

     O ministro da Fazenda, Guido Mantega, com a ousadia dos que se sabem inimputáveis, garantiu que o preço da gasolina não vai subir em abril. E usou um argumento que, para ele, define bem sua autoridade no assunto: lembrou que é o presidente do Conselho da Petrobras e ministro, portanto acionista majoritário da empresa.
     Mantega, como se vivesse num mundo paralelo, bizarro, costuma se dar o direito de verbalizar esse tipo de afirmação, contando com a boa vontade e a falta de determinação dos que o ouvem. Se não fosse assim, alguém teria lembrado ao ministro que o preço da gasolina vem sofrendo aumentos diariamente e que já há postos de abastecimento no Rio de Janeiro cobrando absurdos R$ 3,00 ou mais pelo litro. Sem falar no escárnio do preço do litro de álcool, cotado a estratosféricos R$ 2,70.
     Para saber isso, não é preciso ser ministro ou coisa que o valha. Basta abastecer o carro, atividade que está cada dia mais difícil para os mortais comuns, num país em que a 'inflação' dos combustíveis já passa de 50%.
     Mas esses dissabores não ocorrem na vida dos abençoados funcionários de primeiríssimo escalão. Esses, não pagam pelo cafezinho que tomam.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Uma aventura caribenha - Capítulo 3


Domingo - 18/07/99 - O encontro com a natureza

     Pixaim, Pantanal Mato-Grossense - Nosso encontro com o Pantanal de Mato Grosso (reencontro no meu caso e de Alexandre Viana) foi, como prevíamos, emocionante. Para mim, é impossível cruzar o portal de acesso a esse mundo sem sentir uma sensação diferente.
     No nosso primeiro dia no Pantanal, percorremos 64 quilômetros de natureza em estado quase puro. Nas raras lagoas que sobrevivem a essa época de estiagem, centenas de jacarés dividem espaço com  milhares de  aves das mais variadas espécies, destaque absoluto para o tuiuiú, ave-símbolo dessa região. Os outros encontros estão marcados para amanhã, quando  vamos participar de um safári fotográfico pelo Rio Pixaim.
     O cansaço desse início de jornada vai ser parcialmente compensado hoje, com a boa utilização da hora que ganhamos ao cruzar um meridiano e chegar em Mato Grosso (uma hora a menos em relação a Brasília). Vamos dormir cedo para aproveitar o nascer do sol, um espetáculo, em especial, por aqui.
    Os equipamentos têm funcionado bem até agora. Minha única briga é com o teclado da Autotrac, que não permite acentuação e não dispõe da cedilha. Sua proposta, aliás, não é facilitar textos de reportagens, e sim comunicação entre motoristas e empresas. Para compensar, tem uma grande vantagem: pode ser usado em qualquer lugar, pois envia seus dados por satélite.

PS: Nessa época, computadores portáteis eram apenas um sonho, para nós.

A força de duas escolas

     Tenho tido muito prazer em cutucar o passado, exercitar a memória. Há dois dias, casos explícitos de intolerância e discriminação me remeteram a exemplos claros e prazerosos de tolerância e integração vividos no subúrbio de Marechal Hermes. Excetuando uma bobagem aqui e outra ali, havia, nos anos 1950 e 1960, pelo menos, uma grande confluência, estimulada, sobretudo, pelo convívio em duas das ótimas escolas públicas do lugar: Evangelina Duarte Batista e Santos Dumont.
     Quase todos os que moravam do lado esquerdo da estação de trens (observando-se o sentido de Deodoro, a última parada das linhas 13, parador, e 23, direto) estudaram ou tinham amigos que haviam estudado em uma dessas duas escolas. E que depois se distribuiriam pelo Ginásio José Acioly e pela Escola Técnica Mauá. Outros - havia um grupo bem expressivo que estudava na parte da tarde - continuariam unido nos colégios Pedro II e Militar, dividindo os bancos do penúltimo vagão do trem das 10h40. E ainda havia os que vinham 'do outro lado'.
     Nos fins de semana, todos se encontravam novamente, embora não ficassem necessariamente juntos. Esse encontro das tardes/noites dos sábados e domingos e feriados acontecia no canteiro central da larga Avenida Oswaldo Cordeiro de Farias, que vai da praça em frente à estação ferroviária ao Hospital Carlos Chagas e ao Teatro Armando Gonzaga.
     Era ali, nessa enorme passarela ornada por tamarindeiros sempre carregados de frutos, que as mocinhas e mocinhos desfilavam depois da missa das seis na Paróquia de Nossa Senhora das Graças.
     A calçada do lado direito era especial. Mais espaçosa e bem arborizada, com ficus gigantes, era reservada aos casais de namorados.
     No lado esquerdo, algumas barracas, pipoqueiros, a farmácia.

Quanto vale um anúncio da Petrobras?

     Vista aqui no alto, mais parece ... Nada disso. Assim, como se lê, é uma bela homenagem do portelense Paulinho da Viola à Mangueira. Na verdade, esse texto começa de uma forma parecida e remete, também a um ideal. Vamos a ele.
     Analisada assim de longe, a proposta que institui o financiamento público das campanhas parece ser algo saudável, igualitário. Afinal, teríamos, em tese, menos fantasias e alegorias e mais apresentação de ideias, projetos. Sintetizando, as campanhas eleitorais passariam, por limitadas financeiramente, a ter mais consistência.
     Mas como tudo é absolutamente relativo no nosso país, antevejo um elemento complicador que talvez macule o projeto: a avalanche de publicidade governamental e as inaugurações de pedras fundamentais seriam computadas na verba do candidato oficial?
     A questão se justifica. Basta lembrar a última eleição, quando o governo despejou uma fábula de recursos na promoção de um Brasil novo, de contos de fada. Um país onde a saúde era perfeita; onde não havia problemas na área de educação; com estradas perfeitas; aeroportos de primeiro mundo; portos eficientes; seguro; e imune a qualquer oscilação no mundo, ao qual dávamos aulas. E onde o petróleo que ainda vai ser encontrado jorrava abundantemente e inundava o planeta, nos anúncios ufanistas da Petrobras.
     E onde o presidente da República agia como um reles cabo eleitoral, usando tempo e projetos pagos por toda a sociedade.
     Portanto, financiamento público de campanha, só com parâmetros muito bem definidos e punições exemplares para transgressores. Chega de multas de R$ 5 mil que não pesam nos bolsos dos partidos.