Parece – infelizmente, apenas parece, mas já é um alento –
que, afinal, a blindagem em torno do ex-presidente Lula começa a ser
destroçada, no rastro dos últimos escândalos envolvendo o Partido dos
Trabalhadores, em especial o assalto aos cofres da Petrobras. Se o país estiver,
de fato, começando a dar a volta por cima dessa fase lastimável da vida
pública, é bem provável que esse processo leve ao sepultamento político de um
dos mais nefastos exemplares de demagogo, populista e estelionatário ideológico
já surgidos ao longo de todos os nossos tempos.
A grande janela que se abre para passar a limpo nossa
história recente passa pelas investigações resultantes da Operação Lava-Jato.
Como nos antecipa a revista Veja que
chegou hoje às bancas, um dos grandes empresários presos estaria a ponto de
formalizar denúncias que já alinhavou em uma espécie de caderno de memórias que
vem sendo escrito na cadeia e que apontam diretamente para o ex-presidente.
Parte dessas memórias chegaram à redação da revista e, se
confirmadas formalmente, serão suficientes para arrastar Lula definitivamente.
Segundo a revista, o empresário relacionou as várias vezes em que foi
solicitado a dar uma ‘ajuda financeira’ ao amigo íntimo, entre elas a reforma
completa de um sítio no interior paulista e apoio financeiro à ex-chefe de
gabinete da Presidência da República em São Paulo, a sra. Rosemary Nóvoa,
apontada como muito íntima do ex-presidente. Com dinheiro do assalto à Petrobras, é evidente.
Até pouco tempo, esse tipo de denúncia ficava limitado a
grupos de adversários do ex-presidente e poucas vezes tinha a repercussão que
merecia. No Mensalão, por exemplo, praticamente passou em branco a notícia de que
Lula estava presente no episódio em que o partido do seu vice, José Alencar,
foi comprado, em dinheiro vivo. O país engoliu a versão risível de que Lula
estava na sala e a tramoia aconteceu no quarto da sala usada para a
pilantragem.
Também não foram levadas em conta as denúncias que surgiram
de depoimentos do publicitário Marcos Valério, que teria participado de
reuniões com o ex-presidente, no Palácio. É verdade que Valério só teria se
disposto a falar depois de condenado e suas revelações foram atribuídas ao
desespero de um condenado.
O caso da ex-chefe de gabinete Rosemary Nóvoa também foi
abafado, como se fosse algo pessoal, uma mera pulada de muro de Lula, quando,
na verdade, envolvia uso de dinheiro público e uso do ‘prestígio’ adquirido nesse
relacionamento para atividades ilícitas.Pressionada, presa e processada, Rosemary
ameaçou falar, mas foi contida, na época, segundo confirmado agora, pela ajuda
do empresário amigo do poder.
O ex-presidente também saiu razoavelmente ileso da denúncia
de que foi um agente do Dops, durante a ditadura militar. Poucas pessoas
tiveram conhecimento ou deram a dimensão real às histórias contadas pelo
ex-secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, que colocam Lula no papel
de uma espécie de ‘cabo Anselmo do ABC’. Qualquer outro político, em qualquer
parte do mundo, teria sucumbido a um fato tão devastador como esse. Lula
sobreviveu.
Assim como sobreviveu à afirmação, de um ex-correligionário,
fundador do PT, como ele, de que teria protagonizado atos deletérios (que eu me
reservo o direito de não explicitar) durante os 30 dias em que esteve preso no
Dops, por liderar greves no ABC.
Tudo isso aconteceu – excetuando o escândalo da Petrobras –
em momentos favoráveis, politicamente, a Lula. Não é o que acontece hoje. Embora
ainda mantenha parte do inegável carisma que o alçou à condição de político mais
importante do país, Lula está sofrendo os efeitos do irreversível desgaste do
PT e da devastação da Petrobras produzida por seus asseclas.
A couraça está visivelmente rachada. Seu futuro imediato está
nas mãos de um empresário desesperado, que talvez esteja usando os últimos
trunfos para escapar da prisão, algo que Marcos Valério não soube fazer e, por
isso, está purgando 40 anos de cadeia. Hoje, nem mesmo os ‘exércitos’ de Stédile e dos dirigentes da CUT seriam capazes de impedir o fim trágico de um homem que conspurcou o cargo que
ocupou.