quinta-feira, 31 de março de 2011

O meio ambiente paga a conta

     O presidente americano, Barack Obama, em discurso ontem nos EUA, ao anunciar novos investimentos na extração de petróleo (contrariando plataforma eleitoral, que apregoava mais recursos para a produção de combustíveis alternativos, é bom se destacar), cometeu o que poderíamos classificar de enorme erro de informação, ao afirmar que, "hoje", 80% da frota brasileira de automóveis movem-se a álcool.
     Acertaria se dissesse que uma enorme fatia da frota brasileira 'pode' se movimentar exclusivamente com esse combustível. Mas não é isso o que vem acontecendo. O absurdo descompasso entre produção e demanda de álcool jogou os preços desse último muito para cima, reduzindo drasticamente sua utilização, por economicamente inviável.
     Hoje, o que acontece nas bombas, é a opção pura e simples pela gasolina, em função do mais elementar cálculo de custo-benefício, capaz de afogar em galões de cifrões os mais sinceros desejos de contribuir com a natureza.
     As justificativas são as mesmas de sempre: quebra de safra, chuva demais, chuva de menos, muito sol, pouco sol. Na verdade, o que move a indústria da cana é o preço final dos produtos que saem das usinas. E produzir açúcar, nesse momento, é bem mais lucrativo do que investir no álcool.
     Uma das soluções inventivas para a escassez de álcool, até mesmo para suprir a necessidade de atender à obrigatória mistura à gasolina, é a adição de mais ... água. Pelo que se depreende, o Brasil não aprendeu tudo o que devia com o fracasso do Pró-Álcool, causado justamente por uma combinação de preços relativamente baixos do petróleo (o que não ocorre agora) e valorização do açúcar no mercado internacional.
     Pelo menos os veículos atuais, equipados com motores flexíveis, podem usar os dois combustíveis, indiscriminadamente, o que não acontecia há 30 anos. Infelizmente, a conta maior será paga pelo meio ambiente.

quarta-feira, 30 de março de 2011

Um título para chamar de seu

     Esperei, até agora, pela devida repercussão do título mundial de futebol de areia conquistado pelo Vasco, no fim de semana passado. Uma notinha aqui, outra ali e a velha desculpa: os jornais já estavam fechados quando houve a decisão.
     Vitórias menos expressivas e esportes muito mais inexpressivos tiveram espaço e destaque imerecidos, frustrando uma legião de torcedores ávida por boas notícias sobre seu clube, tão raras ultimamente.
     E, convenhamos: a enorme torcida do Vasco - capaz de encher estádios em todo o Brasil - merecia uma boa cobertura de uma competição que teve atletas com a camisa da Cruz de Malta levantando um troféu de campeão.

A intolerância não tem defesa

     Um antigo e fraterno amigo, com o qual tenho divergências ideológicas já 'históricas' (afinal, nossa irreversível amizade completou 53 anos...), fez algumas restrições ao texto no qual também critiquei duramente o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ). Não à essência das críticas ao racismo hidrófobo e ao homofobismo desatinado, ressalvo. Mas à motivação extra que ele vislumbra nos jornalistas, em geral.
     Ele acredita, realmente, que o linchamento do ex-capitão tem estreita ligação com o fato de ele ser um representante assumido do pensamento de direita, com o 'agravante' de ser uma espécie de porta-voz oficioso de grande parte das Forças Armadas, o que despertaria velhos ressentimentos.
     Creio que não, pelo menos totalmente. Pela insensatez das suas colocações, Bolsonaro não escaparia do apedrejamento moral mesmo que desfilasse no Eixo Monumental com a bandeira do PT em uma das mãos e uma foice e um martelo na outra.
     Mas alguma lógica - sou forçado a admitir - há nas suas ponderações, que foram pessoais, mas que tomei a liberdade de tornar públicas. Se não houvesse, como explicar o endeusamento acrítico de genocidas como Stalin e Mao? E a tolerância incompreensível com outros assassinos, como Muamar Kadafi e Mahmoud Ahamadinejad? E a defesa do indefensável tiranete Hugo Chavez, o inimigo número um da imprensa livre? E as desculpas que tentam justificar o mensalão e os mensaleiros? Ou os sorrisos condescendentes que acompanham todas as bobagens - e são incontáveis - recitadas dia após dia pelo ex-presidente Lula?
     A contundência da reação à intolerância representada por Jair Bolsonaro, no entanto, é absolutamente pertinente. E insisto, deveria ser endossada mesmo que indiretamente pelas Forças Armadas, pelo desserviço que personagens assim prestam à consolidação da democracia, baseada, antes de tudo, na igualdade.

Inimigos da liberdade

     Hugo Chavez, o bufão do Caribe, foi homenageado, ontem, na Argentina, como um defensor da liberdade de imprensa. Logo ele, que fechou jornais e emissoras de televisão pelo simples fato de criticarem seu governo. Ao seu lado, Cristina Kirchner, a presidente que ignorou uma ordem judicial e ajudou a impedir a circulação dos jornais Clarín, Olé e La Nación, bloqueados por 'sindicalistas'.
     São dois gigantes da luta pela liberdade de opinião, parceiros de primeira hora dos últimos governos brasileiros, com os quais sempre tiveram enorme afinidade. Fazem, nos seus países, o que muitos gostariam de fazer aqui: punir a opinião, transformando-a em crime, quando não agradar ao Poder.
     Fico aguardando manifestações de desagravo dos sindicatos e da federação dos jornalistas.

terça-feira, 29 de março de 2011

A volta do discurso vazio

     Entre platitudes e demonstrações explícitas de falta de conhecimento geral, o ex-presidente Lula reinaugurou, ontem, em Portugal - onde foi receber uma dúzia e meia de prêmios -, o modelo de discurso em que nada diz, mas com uma enorme veemência.
     Responsável direto por um buraco astronômico nas contas internas, concedeu-se o direito de dar conselhos sobre a política econômica de Portugal, país que está mergulhando em uma crise semelhante à da Grécia. E ainda sugeriu que o Brasil - que, deduz-se pela discurseira, está nadando em dinheiro e com a inflação controlada - crie um pacote de bondades.
     Aqui no Brasil, no terreno esportivo, ao qual recorre sempre, deu-se ao direito de aconselhar Adriano, a nova referência corintiana, e antever sua convocação para a Seleção Brasileira. Esse 'cara' é o verdadeiro fenômeno.

Preconceito e crime

     O desserviço que o deputado federal e ex-capitão do Exército Jair Bolsonaro (PP-RJ) presta constantemente à democracia, às Forças Armadas e, em síntese, ao país, é incalculável. Ontem, entrevistado em um programa humorístico da Tevê Bandeirantes (a franquia internacional CQC), Bolsonaro conseguiu se superar com uma afirmação tão estúpida que me permite duvidar da sua sanidade mental.
     Questionado sobre qual seria sua reação se um de seus filhos namorasse uma mulher negra, reagiu com a inconsequência dos desatinados, classificando essa hipótese de "promiscuidade".
     É difícil acreditar que alguém, com a 'responsabilidade' de exercer um mandato público, chegue a esse grau de 'irresponsabilidade', expressando dessa forma um preconceito abominável e criminoso.
     Paralelamente, com suas explosões de imbecilidade, age como um elemento deflagrador de ressentimentos ainda latentes na relação de parte da sociedade com os militares, especialmente num momento político delicado nessas mesmas relações, em função das criação da contestada Comissão da Verdade.
     Em ocasiões anteriores, Bolsonaro já havia exibido sintomas de intolerância explícita com homossexuais, por exemplo, mas ontem ele se superou. E não há prerrogativa de mandato que sustente seu direito de ser repugnante.

segunda-feira, 28 de março de 2011

O partido do 'muito pelo contrário"

     Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, disse que seu novo partido, o PSD, não será de direita, nem de esquerda, nem de centro. Faltou apenas completar com o "muito pelo contrário" da velha piada.
     Pelo que se anuncia, não será muito diferente da quase totalidade dos partidos políticos brasileiros, atrelados, apenas, à busca de cargos e salários para atender aos companheiros e familiares.
     O mais grave, é que esse tipo de 'proposta política' tem muitas chances de prosperar, independentemente da orientação partidária do governo de plantão. Os partidos do "muito pelo contrário" atendem perfeitamente aos que estão no poder, pela facilidade e volúpia com que aderem.
     O maior exemplo de sucesso dessa 'ideologia', não por acaso, é o PMDB, um vigoroso defensor de qualquer um que esteja com a caneta na mão. Sobreviveu assim no governo de Fernando Henrique Cardoso. Fortaleceu-se na Era Lula. Consolidou-se agora, como vice de Dilma.
     O PSD nasce, ao que tudo indica, com um objetivo na vida: quer ser igual ao partido de José Sarney quando crescer.

A cultura das vantagens

     A questão da captação de recursos para atividades teoricamente culturais não pode ser resumida a uma discussão sobre as qualidades artísticas de Maria Bethania ou a eventual falta de qualificação da banda do filho do jornalista Ricardo Noblat, liberadas, as duas - como foi divulgado -, para embolsar cerca de R$ 2, 3 milhões. Dinheiro que, em síntese, se origina de impostos que deveriam ser revertidos em benefício da sociedade como um todo.
     A polêmica que ressurgiu agora, em função da tal autorização para que um projeto de Maria Bethania seja beneficiado pelos incentivos da Lei Rouanet (renúncia fiscal), deve remeter, sim, a uma reavaliação da execução da própria legislação, que transforma o Estado em fiel da Cultura, pelo poder de veto e aval aos projetos.
     O espírito da Lei talvez seja irretocável: estimular a criação de projetos culturais, através do uso de parte dos impostos devidos por empresas. A distorção foi surgindo ao longo do tempo. Não há nada que justifique - ao meu ver - que nossos impostos contribuam para a cantora baiana Ivete Sangalo - nada contra ela, em especial -, por exemplo, pagar o combustível de seu avião particular. Ou que beneficie 'artistas' afinados com o poder. Ou ainda, 'obras' como o filme que contou a parte lacrimejante da vida do ex-presidente, em plena campanha eleitoral.
     Esse dinheiro - um eldorado cobiçado por milhares de exploradores - estaria mais bem empregado se revertido - digamos - em projetos de inserção social através dos vários caminhos oferecidos pelas manifestações culturais. Ou na criação e/ou recomposição de bibliotecas; de programas de reciclagem de professores. Será que essas iniciativas não se caracterizam como instrumentos da cultura?

sábado, 26 de março de 2011

Histórias de Júlia e Pedro (10)

Rapidez de raciocínio    

     Júlia - e eu vou me permitir ser repetitivo - desde cedo nos surpreendia com uma enorme criatividade e um vocabulário além do normal. Certa vez, quando ainda não completara três anos, "do nada", como ele gosta de dizer, leu para nós - ela estava na cadeirinha no banco de trás do meu carro - o número de um ônibus que passava ao lado.
     Estou usando essa introdução para relembrar um momento dessa rapidez de raciocício, de criatividade.
     Ela estava brincando sozinha no quarto quando escorregou, caiu e veio se lamentar, chorando. A mãe logo quis saber como foi a queda, onde havia machucado. A resposta fez todos sorrirem:
     - Eu machuquei o ... o ... o ... 'joelho' do meu braço.
     Só a partir de então a palavra 'cotovelo' passou a integrar seu dia-a-dia.

A Vale ameaçada

     Há alguns dias, Míriam Leitão, em sua coluna em O Globo, praticamente esgotou - por clara, incisiva e irretocável - a avaliação sobre mais esse lamentável momento da vida política nacional: a absurda intervenção do Governo para conseguir a saída do atual presidente da Vale, Roger Agnelli. Ouso acrescentar algumas considerações, sempre levando em conta que a Vale - parece que o Palácio do Planalto insiste em desconhecer - é uma empresa privada (a maior do país) que deve, antes de mais nada, prestar contas aos acionistas, e não ao governante de plantão.
     Além da indesculpável intervenção, a lamentar, também, o papel medíocre e apequenado do ministro da Fazenda, Guido Mantega, na sua desesperada luta para reconquistar espaços no primeiro escalão do governo, depois de ser bombardeado pelo 'fogo amigo' que parece ser disparado do terceiro andar do Palácio. Mantega fez o papel que lhe designaram, servindo de menino de recados nos encontros para conseguir a adesão da direção do Bradesco, acionista de peso e decisivo na obtenção dos votos necessários à demissão de Agnelli.
     Para tentar evitar interpretações ainda mais críticas, porta-vozes do Governo - alguns deles ocupando colunas de jornais - já andam espalhando que o novo presidente da Vale sairá dos quadros da empresa, e não de um diretório do PT, como acontece normalmente. A julgar pelo histórico recente, no entanto, a Vale corre, sim, o risco de se transformar em mais um instrumento político, refúgio seguro para deserdados pelas urnas.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Se eles dizem sim, eu digo não!

     Quando o presidente do Senado e ex-presidente José Sarney critica a decisão do STF sobre a aplicação da 'lei da ficha limpa', começo a achar que estou com a razão, ao me identicar com a maioria dos ministros, na defesa dos preceitos constitucionais (é claro), nunca dos pilantras. Aliás, eu sempre acredito que estou certo ao olhar para o 'outro lado' e vislumbrar personagens como Aloísio Mercadante e Ideli Salvati, por exemplo.

Sim à Constituição

     Certamente ninguém - exceto eles, os beneficiados, e seus apaniguados - está satisfeito com o desfecho do julgamento que beneficiou os chamados 'fichas sujas'. A política, como uma atividade fundamental na estabilidade democrática, deveria ser aberta apenas a pessoas acima de qualquer suspeita, independentemente, por óbvio, de tendências ou ideologias. Nela não cabem, certamente, Arrudas, Joões Paulos e quetais, corpos que deveriam ser expurgados definitivamente.
     Mas nem mesmo tendo essa convicção consigo enxergar outro caminho que não fosse o trilhado pelo STF. Os crimes cometidos por uma legião de políticos não estiveram, jamais, em julgamento. Decidiu-se pelo respeito à Constituição.
     Se fosse permitido anular preceitos constitucionais, hoje, pelo fato de a causa ser 'nobre', não teríamos como impedir, amanhã, que argumentos semelhantes fossem usados em projetos não-republicanos.
     Já vivemos, no Brasil, recentemente, um longo período em que a Constituição era ignorada ou manipulada, sob as mais variadas justificativas. E pagamos muito caro por isso.

Heróis reciclados

     A nova temporada de CSI NY está me remetendo aos primórdios da série, quando tive muitas dificuldades em olhar para Gary Sinise e esquecer que ele tinha sequestrado o filho de Mel Gibson, pouco tempo antes, quando já era policial.
     O problema de identificação está acontecendo de novo. Olho para Sela Ward (a musa quarentona), a nova cientista dos laboratórios policiais de Nova Iorque - entrou na vaga deixada por Melina Kanakaredes - e lembro na hora que ela era advogada e ex-mulher do Dr. House, com quem manteve um a relação difícil quando voltou a trabalhar no mesmo hospital do ex-marido.
     Talvez seja por isso que não consigo acompanhar a tal de No ordinary family (Sony). Quando vejo o Michael Chiklis fazendo retratos falados em uma delegacia, lembro dele atropelando a tudo e a todos quando era o chefe de uma de equipe  de 'bandidos policiais' no sensacional The Shield. E a Julie Benz? Como num passe de mágica, largou a profissão de dançarina (Desperate Housewives), sufocou sua predileção por outras mulheres, casou com um psicopata 'do bem' (Dexter) e, ao mesmo tempo, conseguiu se formar em Biologia e casar com o Chiklis.
     E estou antevendo novos e grandes problemas. Estão vindo aí duas séries, uma com uma antiga dona de casa de Histeria Lane (a tal que 'quase' namorou a Julie Benz), que vira médica legista; e outra com o Jim Belushi, que vai se desdobrar entre a casa de subúrbio - que divide com a mulher, cinco filhos e um cunhado onipresente - e um escritório de advogados.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Os dois lados de Ponte Alta (*)

     Ao escrever sobre os incidentes em Ponte Alta do Tocantins que me conduziram à 22ª Vara Criminal, há dois dias - para depor como testemunha, frise-se (leia texto do dia 23) -, lembrei imediata e claramente de outra incursão que fiz à região, um ano antes, em plena campanha eleitoral para prefeito e vereadores, na companhia de dois queridos amigos de infância de Marechal Hermes. Nessa ocasião, a cidade transpirava 'política'.
     Nas ruas, os dois principais adversários - Cleyton Maia e Arthur Alcides de Barros - lutavam, com as armas à disposição, pelos votos dos 4 mil e poucos eleitores do município. Venceu Cleytom Maia, que derrotou o então prefeito, Alcides, graças - acredito - à 'criatividade' de sua campanha, que usou e abusou dos carros de som e, em especial, de uma 'composição musical' elaborada especialmente para a ocasião, cujo refrão acho que jamais vou esquecer.
     Para satanizar o prefeito e seu adversário, Cleyton, na voz de um cantor local, apregoava:
     "No lado de lá, a coisa tá feia;
       No lado de cá, o povo leva peia".
    

     Para que todos entendam a - digamos - 'poesia da imagem': Ponte Alta, portal de entrada de uma das mais belas regiões do país, o Jalapão, é dividida (em dois 'lados') por um belo e cristalino rio, cujo nome batiza também a cidade.

Histórico político
  


   1) Em outubro do ano passado, Cleyton Maia (DEM) foi preso por crime eleitoral , após denúncias de que estaria comprando combustível para distribuir na cidade, durante a última campanha.
     2) Pouco antes, Cleyton Maia foi acusado pelo Ministério Público Federal do Tocantins de causar danos à Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins, a 40 quilômetros de Mateiros (município vizinho). Segundo o Ministério, Maia mantinha uma pista de pouso e uma cascalheira aparentemente abandonada e não recuperada, "sem a devida licença do órgão gestor da unidade de conservação".
     3) Artur Alcides de Souza Barros (PMDB) foi denunciado criminalmente pelo Ministério Público Federal no Tocantins por suposto desvio de verba pública federal relativo a convênio firmado com o Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE) para reforma do Centro Educacional Sabino Ferreira, em junho de 2006, quando ainda era prefeito.

     (*) Com a decisiva colaboração de Paulo Sérgio Moreira de Carvalho, um dos amigos de infância que me acompanharam em uma das minhas seis incursões ao Jalapão (o outro foi Antônio Carlos da Mota Figueiredo, o Tôni).

A farra do álcool

     Um dos exemplos práticos do descaso nacional com o meio ambiente é a atual escalada de preços do etanol, responsável por uma enorme queda no consumo desse combustível, menos poluente do que a gasolina. Motivados basicamente pela valorização do açúcar no mercado externo, nossos produtores - alegando motivos tão fúteis quanto inverossímeis - optaram pelo lucro maior e reduziram a produção do álcool, o que acarretou uma absurda alta no preço nos postos.     
     O consumidor, que mais uma vez acreditou no álcool como combustível para mover seu carro, viu-se obrigado a mergulhar por inteiro na gasolina, mais rentável, embora mais cara (o álcool só passa a valer a pena, no bolso, quando seu preço fica, no máximo, a 70% do cobrado pela gasolina) e muito mais agressiva ao ambiente.
     Além de penalizar o consumidor e piorar a qualidade do ar das cidades, esse aumento desenfreado de preços desmerece os investimentos na tecnologia de motores flexíveis, um dos orgulhos nacionais.

Nem sim, nem não ...

     O Brasil, anunciam todas as agências de notícias - fazendo ressalvas, sem ressalvar; dizendo e desdizendo; indo e voltando; nem sim, nem não, muito pelo contrário -, acabou votando a favor da indicação, pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, sediado em Genebra, de um investigador independente para o Irã. A esse investigador caberá avaliar o regime dos aiatolás, responsável por uma escalada sem precedentes na repressão a adversários políticos e na execução de penas de morte.
     Ao mesmo tempo, a diplomacia brasileira tenta não ser desmoralizada totalmente na questão líbia, criticando oficialmente o uso da força contra o governo do ditador Muamar Kadafi, mas sem o vigor percebido em outras eras. É um trabalho que exige muito jogo de cintura dos diplomatas envolvidos nesse vai-não-vai político, voltado para a busca patológica por um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU!

Barrado no baile (ou: 'Liga não, mô')

     Marilê bem que tentou fingir que nada estava acontecendo. Acordava, colocava comida para a pequinês Martinha, ligava o rádio na 'FM do Pagode' e começava a fazer o café, retomando uma rotina de muitos anos atrás, quando o marido ainda não tinha sido promovido a chefe do setor de suprimentos do Instituto do Açúcar e do Álcool.
     Durante aqueles últimos oito anos, ela e Linácio tinham experimentado uma vida jamais sonhada. Viajaram muito, ganharam muitos presentes de fornecedores, ávidos por conquistar as boas graças do novo chefe, conseguiram bons empregos para as crianças e ainda tiveram o que pensavam ser um prêmio de consolação, quando o marido se aposentou: a nova chefe de seção era amiga do casal, o que garantiria, pelo menos, convites para alguns convescotes regados ao "velho oitão", como Linácio brincava, e fartos em enroladinhos de salsicha, os preferidos da família.
     A realidade, no entanto, se mostrou diferente: "A vida é dura Marilê", constatava o marido, de hora em hora. E voltava à leitura e releitura (por falta de hábito, esquecia rapidamente tudo o que lera minutos antes) das histórias em quadrinhos dos suplementos infantis abandonados no sofá pelos netos, nas já não tão constantes visitas dominicais.
     A sorte de Marilê é que havia o tal do futebol: "Benditos americanos", festejava intimamente, trocando, sem se dar conta, a origem de um dos prazeres do "homem". "Se não fosse o tal do futebol, quase todos os dias, o que seria da vida dos dois?", se perguntava, temendo antecipadamente a resposta.
     Mas nem mesmo o futebol - um dos seus times de coração liderava o campeonato - foi suficiente para aplacar a última desilusão de Linácio. Ele sabia que a assinatura de um novo contrato para fornecimento de materiais de higiene - a grande estrela seria o papel de três folhas - para toda a diretoria seria marcada por uma festança. Um amigo, dos poucos que restaram, já lhe confidenciara que, dessa vez, o 'Oitão' seria substituído pelo 'Bala', coisa fina.
     Marilê, precavida, mandara o vestido de festa para a lavanderia e repassara, ela mesma, o terno mais bonito do marido. E os dois ficaram esperando o convite, como quem espera uma loteria acumulada. Cada toque da campainha provocava um sobressalto. Nada. O tempo passou na janela e o convite não veio.
     - A vida é dura, Marilê", constatou Linácio.
     - Liga não, 'mô'. Acho que hoje tem jogo do Curingão na televisão", consolou Marilê.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Chamem a polícia!


     Estimulado pela presença de Tom Selleck e de bons coadjuvantes, andei investindo no canal LIV, para assistir às peripécias de True Bloods (segundas, às 22 horas). Mas já estou quase pensando em desistir. A série até que proporciona um razoável divertimento, embora tão previsível quanto projetos semelhantes. O problema, de fato, está na hora dos comerciais, das chamadas para outros programas do canal.
     Eu - como já destaquei em outras ocasiões - aciono logo a tecla mute, para não ferir os ouvidos com idiotices, e aproveito para aqueles minutos para fazer algo mais produtivo, como reler partes do jornal da manhã. Ou simplesmente fico trocando de canal, aleatoriamente, para gastar o tempo.
     Mas às vezes não dá. E, aí, fica-se sabendo - mesmo contra a vontade - que o canal LIV exibe também um tal de Cake Boss, imbecilidade semelhante a Hell's Kitchen, America's Next Top Model e outras 'atrações' da mesma estirpe. Programas em nada comparáveis ao deletério BBB, mas nem por isso menos detestáveis.

Um cientista do Caribe

     Aí vai um texto que, pela magnificência do tema, merecia o tratamento imediato que o 'caso de Ponte Alta' (postagem anterior) postergou. Hugo Chavez, o fanfarrão do Caribe, o impagável coronel de opereta, voltou a atacar, sem medo de ser ridículo (convenhamos, seria pedir muito). Ontem, no 'Dia Mundial da Água', num daqueles insuportáveis discursos que obriga a tevê estatal a transmitir, o inimigo número um da sanidade mental expeliu uma nova e aterradora teoria: Marte - ele mesmo, o 'planeta vermelho' - já teria sido habitado (por homenzinhos verdes e com antenas, certamente), mas sucumbiu às mazelas do ... capitalismo.
     Não é uma piada, acreditem. É algo concreto (na verdade, deve ser 'pastoso'), saído daquela cabecinha. E talvez ajude a explicar a afinidade que o algoz da Venezuela mantém com nosso ex-presidente, autor - ele também - de uma tese (entre tantas outras) capaz de envergonhar criancinhas do ensino fundamental: as vantagens ecológicas que a Terra teria se fosse ... plana.
     Eles, realmente, se merecem.

As noites de Ponte Alta

Os desdobramentos de um pequeno incidente ocorrido há um ano e meio praticamente ocuparam todo o meu dia, ontem. Intimado formalmente (carta precatória), em casa, por um oficial de justiça, fui obrigado a depor na 22ª Vara Criminal, como testemunha de acusação (!!!) de um processo que está correndo na cidade de ... Ponte Alta do Tocantins, uma espécie de portal de entrada do Jalapão, um paraíso ecológico ainda praticamente intocado no qual já 'mergulhei' cinco ou seis vezes.
Tudo começou numa segunda-feira – é isso mesmo, segunda-feira - de outubro de 2009. Uma - podemos chamar assim – ‘casa de festas’ da cidade, mantendo uma já insuportável tradição, ligou sua aparelhagem de som no volume mais alto, sapecou uma seleção de pagodes e axés na vitrola e não deixou ninguém dormir, sem distinguir entre moradores e os mistos de turistas e aventureiros que por lá estavam.
Da discussão do problema com o dono da pousada onde estávamos hospedados (eu e  Guilherme, meu genro mais novo), surgiu a proposta para que fizéssemos uma carta que, além de reclamar do desrespeito à legislação do silêncio, ponderasse quanto à impropriedade daquele comportamento justamente em uma região fadada ao turismo ecológico. Fizemos, mandamos por e-mail, confirmamos a autencidade por telefone (a essa altura, a carta já havia sido encaminhada pelo hoteleiro à delegacia local) e esquecemos o caso.
Pois bem: pelo que fiquei sabendo ontem, ao ouvir a leitura do processo, a busca pela paz virou caso de polícia, mesmo, colocando em polos opostos os donos de pousadas (preocupados com o bem-estar de seus hóspedes e com suas caixas registradoras, não necessariamente nessa ordem) e os barões das noites locais. Um caso que promete se estender e que espero estar resolvido até minha nova viagem ao Tocantins.
Na verdade, contei toda essa história para justificar alguns comentários de hoje, que deveriam ter sido postados ontem e que foram postergados a bem da saúde física e mental dos que vivem ou se aventuram em Ponte Alta.

terça-feira, 22 de março de 2011

Histórias de Júlia e Pedro (9)

Xixi na cueca



                A libertação de Pedro da fralda noturna foi muito comemorada e divulgada pela mãe, Flávia. Afinal, o moleque já estava com três anos e meio, 'maduro' o suficiente para entrar nessa nova fase da vida.
                Os primeiros dias se passaram com tranquilidade. Xixi, só pela manhã, ao acordar. Até que, na semana passada, depois de dez dias dormindo de cueca e pijama, ele não resistiu e, pouco antes de deitar, pediu para colocar a "faldinha", como fazia sempre.
                Com calma, a mãe explicou que ele já estava ficando grande, já fazia capoeira e natação e 'estudava' inglês. Não precisava mais daquele apoio.
                A resposta, em tom choroso, quase provocou o retorno imediato às fraldas:
                - Eu não sou 'gande'. Eu ainda sou um bebezinho ..."

segunda-feira, 21 de março de 2011

Pérolas do futebol

    Duas notícias do mundo esportivo, oriundas de São Paulo, e destacadas pela Folha, merecem, a meu ver, alguns comentários. Vamos a elas:
    1 - Tite, o técnico do Corinthians, disse que o time é mais rápido se
m Ronaldo: por que ele não disse isso antes, quando o 'Fenômeno' ainda tentava jogar futebol? Agora, quando o ex-jogador se divide entre eventos sociais e programas de tevê, é fácil ...
    2 - Muricy Ramalho admite reduzir as férias para assumir o Santos: por que ele - que se diz tão íntegro e sério - não divulgou logo, quando abandonou o Fluminense, que tinha convite do Santos? Ou será que alguém acredita que o convite só foi feito depois que o técnico deixou as Laranjeiras?

Mediocridade e violência

     Embora correndo o risco de ser recorrente, não posso deixar de resgistrar a decepção de ver tanto espaço nobre dos nossos jornais e revistas sendo ocupado por notícias sobre os execrável BBB e sanguinolento UFC. É impressionante - no sentido ruim da expressão - o destaque a esses dois representantes dos 'tempos modernos'. Não consigo encontrar explicação racional para a repercussão dada à mediocridade de um e à violência do outro. Ambos, exemplos gritantes de idolatria desvirtuada.

Mais um narciso paulista

     O show de arrogância e falta de espírito público proporcionado por nossos políticos em geral teve novo capítulo nesse fim de semana, com a saída do prefeito de São paulo, Gilberto Kassab, do DEM, para fundar um novo partido, o PSD (Partido Social Democrático), movido apenas e exclusivamente por um motivo: quer ser o próximo governador paulista. Repete, assim, a prepotência de seu amigo e ainda apoiador, José Serra, que jamais pensou em um projeto político partidário, e sim nas suas ambições pessoais.

A invasão chinesa das ruas

     A invasão de produtos chineses começa a extrapolar prateleiras para ocupar, também, nossas ruas e estradas. O lançamento em grande estilo dos modelos da JAC - com direito à participação direta do apresentador Faustão, um dos destacados garotos-propagandas da tevê - mostra que a ocupação de espaços no mercado automobilístico nacional é mais do que uma eventual possibilidade.
     A China, maior fabricante mundial de veículos, pelo que se depreende das últimas iniciativas, não pretende deixar a oportunidade de explorar um mercado - o brasileiro - que, ao contrário da maior parte do mundo, cresce continuamente. E, como acontece com os produtos 'made in China' em geral, o preço desponta como um dos principais atrativos.
     Os modelos da JAC - de imediato, só o J3, em suas versões hatch e sedan; mais tarde chegarão o J5 e o J6 - têm, no entanto, um desafio pela frente: mostrar que podem ser acessíveis e, ao mesmo tempo, de boa qualidade, além de superar a desconfiança que cerca todas as marcas que não estão estabelecidas, de fato, no país.
     A estratégia de vendas explora dois ícones nesse mercado tão disputado: paralelamente a ser apresentado como o mais completo e barato (R$ 37.900 o hatch e 39.900 o sedan) do seu segmento, já que todos os componentes são de série, o J3 oferece a inédita garantia de seis anos. Um prazo certamente pensado com muito carinho, pois supera com folgas a faixa de financiamento que vem sendo mais explorada atualmente, que é a de pagamento em 60 prestações.
     Não deixa de ser confortador, para o consumidor, pensar que seu carro não vai dar um 'chabu' irreversível acabar antes de ele acabar de pagá-lo. Ou que sua garantia não irá se desintegrar nos buracos das nossas ruas e estradas. O segredo - insisto - será convencer o público que a garantia será honrada, sim, a tempo e a hora, independentemente da existência, ou não, de uma fábrica aqui no Brasil, fato que seria compensando pela existência de uma rede inicial de 50 concessionárias.
     Se depender apenas das linhas bem agradáveis e modernas - que contam com a assinatura Pininfarina -, o J3 começa bem sua trajetória. Mas terá que exibir um desempenho acima da média, para conseguir reverter o estilo do nosso consumidor de automóveis, um misto de conservador e seguro, escaldado por aventuras internacionais em um passado não muito distante.

domingo, 20 de março de 2011

Civilidade e educação

     A presidente Dilma Roussef deu, sábado, um enorme exemplo de que é possível, sim, conviver educadamente com adversários políticos. O convite aos ex-presidentes e oposicionistas Fernando Henrique Cardoso e Itamar Franco, para que participassem do almoço oferecido a Barack Obama, mostrou apreço não apenas aos convidados em si, mas ao papel que desempenharam na história recente do país. Foi uma demonstração, no mínimo, de civilidade, algo que costumava faltar no governo passado.

Uno assume a 'pole'

     A liderança do mercado nacional conquistada, em fevereiro, pelo Uno, principal modelo da Fiat, desbancando o Volkswagen Gol depois de 24 anos, deveria servir de alerta às demais montadoras em geral, mesmo que seja provisória, como já aconteceu há algum tempo. Embora os números do Uno (21.470 veículos emplacados, 481 a mais do que o segundo colocado) contemplem também o modelo antigo, essa tendência é mais do que sintomática. Expõe uma faceta do - digamos - novo consumidor, que cada vez mais exige alguma ousadia de linhas, inovações, diferenciais.
     Independentemente do gosto pessoal - há quem ame, e os números provam isso, mas também há quem deteste -, é inegável que o novo Uno fugiu às amarras impostas pelo feijão-com-arroz estético dos modelos que trafegam na mesma faixa - Corsa, Fiesta antigo, Peugeot 207 e o próprio Gol, por exemplo.
     A lamentar, num mercado que quebra recordes mensalmente, o custo do automóvel brasileiro, muito maior do que em quase todo o mundo, em virtude - temos que admitir - da aburda carga de impostos. A propósito, sempre que esse tema vem à discussão, costumo lembrar um episódio que, por acaso, envolveu a Fiat, nos idos dos anos 1990.
     O Palio Weekend acabara de ser lançado no Brasil, pela montadora de Betim, e estava sendo apresentado ao consumidor italiano. Mesmo depois de enfrentar o custo do transporte rodoviário até um porto, um longo caminho marítimo e as taxas locais, o modelo chegava ao consumidor italiano por um preço inferior ao cobrado no Brasil.

sábado, 19 de março de 2011

A reação esperada

     Hugo Chavez, como era de se esperar, reagiu imediatamente à notícia da intervenção militar estrangeira na Líbia. Mais comedidos, os russos apenas 'lamentaram' a ofensiva francesa. Os dois países - Venezuela e Rússia, além de Alemanha e Brasil - tinham se abstido na votação do Conselho de Segurança da ONU, que aprovou a criação de uma zona de exclusão aérea e permitiu a intervenção, caso os ataques de Kadafi a civis continuassem.
     O coronel de opereta venezuelano, para não perder o hábito, acusou os Estados Unidos de serem os verdadeiros responsáveis pela intervenção. Ainda não prometeu enviar tropas para ajudar o parceiro Kadafi, mas todos sabem o quanto ele pode ser ridículo (as cenas da exumação dos restos mortais de Simon Bolivar estão aí, para ninguém dizer que eu exagero). No fundo, talvez esteja defendendo, mesmo, sua cadeira, que balança - já meio trôpega - há algum tempo.

O começo do fim?

     As agências internacionais notificam um fato, ao mesmo tempo, promissor e assustador: a aviação francesa sobrevoou território líbio e atacou uma coluna militar e atingiu, pelo menos, quatro tanques. Pode ser - e o mundo livre espera que sim - o começo efetivo do fim de uma das mais longas e criminosas ditaduras dos tempos modernos. Mas também pode representar o início de uma ofensiva terrorista sem precedentes, patrocinada por Kadafi.
     Como a iniciativa partiu da França - e não dos Estados Unidos, como costuma acontecer -, deve receber o apoio de quase todas as nações - o que não costuma acontecer com os americanos, independentemente do adversário da vez. A Inglaterra, talvez temerosa de perder protagonismo para a França, sua rival histórica, já anunciou que está mesmo na hora de acabar com o reinado de Kadafi.
     Diante desses fatos, consumados, é improvável que a Alemanha mantenha sua discutível posição de neutralidade, o que serviria para apressar a queda do ditador líbio. O Brasil ... Bem, nesse caso, em especial (como na maioria das crises internacionais), a posição brasileira não tem a menor importância.

    

Histórias de Júlia e Pedro (8)

     Seguindo as normas
     Júlia, desde bem pequena, foi sempre disciplinada e comportada na creche/escola que frequentou até os seis anos. E essa característica foi decisiva em um episódio (mais um) protagonizado por ela e que nos fez rir bastante.
     Ela, seguindo nossa opção gastronômica – minha e da mãe -, não come aves. E não foi foi por falta de incentivo. A rejeição surgiu naturalmente e foi respeitada em casa: nas suas refeições, só carne vermelha e peixes.
     Até que um dia, quando ela tinha lá seus cinco anos, a mãe notou que a professora registrara, na agenda diária, que Júlia havia comido muito bem o jantar, que incluía frango. Era a oportunidade esperada para estimular o hábito.
     - Júlia, você já gosta de franguinho, que bom!".
     - Mamãe, eu não gosto de frango", respondeu, séria.
     - Mas você comeu tudo na escolinha ...
     - Mamãe - retrucou, definitiva, acentuando a última palavra -, a escolinha tem normas."

sexta-feira, 18 de março de 2011

Um pontapé no Obama


Se eu fora um militante do PT, daqueles que colocavam durepox na fechadura de agências bancárias e pediam o impeachment do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso no primeiro dia de seu segundo mandato, certamente estaria desnorteado hoje, véspera da visita ao país do símbolo maior do império do mal.
Não é que a presidente eleita pelo partido e seus líderes estão - digamos - chateados com a notícia de que há preparativos, no Rio, para um ato de contrário à visita de Obama ao Brasil? Logo eles, que jamais levantaram a voz quando petistas de carteirinha distribuíam 'afagos' em vários 'agentes do imperialismo', ou quebravam janelas de ônibus a pedradas. Ao contrário. Seus atos, que os "reacionários" classificavam de vandalismo, tinham sempre uma análise amiga, uma justificativa por parte da cúpula partidária, que não conseguia esconder o riso ao saborear as imagens.
Bons tempos aqueles - devem estar pensando aqueles ativistas -, quando chutes, xingamentos e atitudes afins eram considerados expressões legítimas da luta de 'ideias'. Por essa, esses idealistas não deveriam estar esperando. Afinal, engoliram calados as demonstrações de carinho-quase-amor entre seu líder maior e José Sarney e Collor; o conluio com Sérgios Cabrais de vários estados; a imolação de José Dirceu.
Essa subserviência ideológica - devem estar se lamentando - merecia ser presenteada, ao menos, com o direito a um chute no traseiro do Obama.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Escapando do incêndio

     Ao ver a fúria de um indignado (e rico) consumidor chinês, que destruiu a marretadas nada menos do que um exclusivíssimo Lamborghini, para demonstrar sua insatisfação com o - digamos - pós-venda, fui remetido a um episódio ocorrido aqui nas nossas bandas, nos anos 1990, quando editava o caderno de automóveis do ainda ativo Jornal do Brasil.
     O alvo da fúria brasileira era apenas um simplório modelo Chevrolet, que - com um defeito original - provocava pesadelos no seu proprietário. Por mais que houvesse tentado, o dono do possante não conseguira o desejado: a troca do veículo. E aqui vale uma observação: essa troca é praticamente impossível. As montadoras têm o direito de tentar reparar defeitos por prazos que, se bem usados (e geralmente são), podem se eternizar.
     Desesperado, o tal proprietário teve uma inspiração: decidiu simplesmente incendiar o automóvel, em frente a uma revendedora, e convocou a imprensa para o ato, com antecedência. Imaginem o rebuliço.
     No episódio brasileiro, o consumidor levou a melhor e conseguiu o acordo com a montadora. Feitas as contas, ficou claro - na ocasião - que a marca ficaria literalmente muito mais queimada com o incêndio do que com a reparação do problema.

Reforma política, já!!!

     Levando em conta a defesa intransigente da prevalência das coligações quando da posse de suplentes de deputados licenciados - em oposição à decisão do STF, favorável aos candidatos do mesmo partido -, vou me permitir uma sugestão que, por absolutamente inovadora (modéstia à parte), pode - por tabela - resolver esse impasse e promover a paz entre esses dois poderes da República, o Legislativo e o Judiciário.
     Antes, algumas digressões. Pelo que emana da Câmara, nossos representantes advogam o direito dos primeiros colocados das coligações. Tanto que têm ignorado liminares do Supremo, graças a artifícios e manobras regimentais. Assim, defendem que quando um deputado do PT é promovido para uma diretoria ou um secretaria (quando o cargo não existe, cria-se um), no seu lugar deve assumir o mais bem votado do grupo que se amontoou na eleição, seja ele do PRB ou do PMN. Em síntese, se é que eu entendi bem: o eleitor escolhe um representante da 'esquerda autêntica', combativa e engajada (seja lá o que isso for), mas assume um pastor da 'Igreja dos Primeiros Dias do Fim do Mundo Que Já Começou', inimigo declarado das rainhas de bateria, autênticas representante do velho satanás que reina nos sambódromos.
     Para evitar esse desconforto - que a alguns pode parecer promiscuidade -, tomo a liberdade de sugerir o fim das atuais agremiações políticas e a posterior criação de - atenção! - apenas DOIS PARTIDOS, que poderiam se chamar Petarena e Pessemedobê. Essa inovação política eliminaria qualquer dúvida no eleitor e acabaria de vez com a divergência entre poderes. Quem votasse novamente em Tiririca, por exemplo, saberia - claramente - que estava ajudando a eleger alguns ex-petistas, já que todos estariam - de fato e de direito - no mesmo saco ideológico.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Partidos e coligações

     A Câmara reluta em atender à determinação do Supremo Tribunal Federal, que prevê a posse de suplentes do mesmo partido do parlamentar que se licencie do cargo, e não da coligação formada em determinada eleição.
     Usando vários artifícios, deputados impediram que a Mesa Diretora cumprisse decisão do STF. Além de demonstrar falta de respeito ao Poder Judiciário, nossos nobres representantes colaboram com a desvalorização do conceito de partido político.
     Uma coligação pode atender a projetos momentâneos, confluência de interesses, mas não deveria se sobrepor jamais ao ideário partidário. Isso, se o país - representado por essas pessoas que estão em Brasília - acredita realmente na importância dos partidos e de suas propostas para o exercício da política.

Cuidado com ele, Fiesp!

     Leio, no Globo, que o ex-chanceler Celso Amorim ressaltou hoje - ao tomar posse no Conselho da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) - que a situação política no Oriente Médio e no Norte da África mostra a falta de capacidade de os Estados Unidos lidarem "sozinhos" com as crises mundiais. Segundo o ex-ministro do governo passado, seria mais uma evidência da importância de o Brasil garantir um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU.
     Eu fico imaginando o Brasil, nesse foro especialíssimo da ONU, defendendo ardorosamente - como defendia, não podemos jamais esquecer - os governos líbio, iraniano, venezuelano e cubano. Certamente a política internacional brasileira exercida nos últimos anos teria amplificado sua coleção de bobagens, vexames e fracassos. Pelo histórico de equívocos do seu mais novo 'conselheiro', é bom que as indústrias paulistas comecem a se preocupar com o futuro próximo.

terça-feira, 15 de março de 2011

Um filme sem mocinhos

     O caos político instalado principalmente nos países do Oriente Médio mostra, a cada dia, desdobramentos inesperados, que levam a situações tão interessantes quanto distintas. Enquanto os rebeldes líbios clamam pela intervenção internacional, única chance - ao que tudo indica - que teriam de vencer a luta contra o ditador Muammar Kadafi, os insurgentes do Barein (de maioria xiita) repudiam a presença de tropas da Arábia Saudita (sunita) no país. Temos, então, movimentos que nasceram da mesma semente, mas que assumiram características próprias e provocam reações antagônicas.
     A mesma Arábia Saudita que envia tropas para ajudar a manutenção do governo do Barein, temendo repercussões nas suas próprias divisas, manobrou para acelerar a queda de Kadafi. No plano europeu, temos a França - crítica feroz da intervenção americana no Iraque, governado na época por um assassino e terrorista - assumindo posições radicais contra o ditador líbio, um terrorista e assassino.
     Em todos os casos, constata-se a indiscutível e nem sempre ética predominância dos interesses particulares de cada nação.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Histórias de Júlia e Pedro (7)

 O homenzinho

    Estávamos vivendo os últimos dias da primavera, mas a tarde estava fria e ventando, como é comum aqui na Pedra. Pedro, que passara o tempo todo correndo atrás de Cléo, sua amiga labradora, vestia apenas uma camiseta de mangas curtas e uma bermuda, inadequadas para aquele momento.
     Preocupadas, Flávia, a mãe, e Isis, a avó, ponderavam para que ele colocasse uma blusa mais quente, assim como Júlia fizera. Para reforçar o apelo, diziam que elas também iriam trocar de roupa e que ele deveria fazer o mesmo. Já irritado com a insistência, respondeu, do seu jeito, reforçando as últimas sílabas das últimas palavras:
     - Eu não 'tô' com frio, ma...mãe!   
     Em seguida, virando-se para mim, que também usava uma camiseta simples, completou o raciocínio, por si só explicativo:
     - Elas 'tá' com frio porque elas 'é' me...ni...nas. Nós 'é' homem, vo...vô!

Acima do bem e do mal

     Eu sei que há um time até mais bem credenciado para discutir a saída de Muricy Ramalho da direção técnica do Fluminense. Mas não resisto à oportunidade de destacar que as razões alegadas pelo treinador não se sustentam. Não é novidade que o tricolor não tem, ainda, uma grande estrutura profissional, o tão falado CT. Isso, até mesmo as cabras vadias que pastam num terreno baldio em Xerém já sabiam.
     Mas essa deficiência não é uma prerrogativa do Fluminense. No Brasil, poucos clubes podem dizer que têm uma estrutura realmente profissional, entre eles São Paulo, Cruzeiro e Atlético Paranaense.
     A desculpa formal, então, soa falsa, frágil. A recusa em falar sobre o assunto, depois do clássico de ontem (Fla 0x0 Flu), não fez justiça à torcida do clube, que deu reiteradas demonstrações de apoio ao treinador.
     Embora reconhecidamente competente - ninguém é campeão tantas vezes por acaso -, Muricy deixa mais uma vez as marcas de arrogância e intratabilidade que pontificam no seu perfil. Além de ter acrescentado mais uma faceta negativa ao currículo: a de ser um profissional capaz de abandonar compromissos pela metade, sem dar - ou dever - explicações. Ô meu!

Erramos (na verdade, errei)

     Não é uma justificativa. Acho que está mais para um pedido de desculpas. Uma espécie de 'perdoem a nossa falha". Relendo os textos, tenho encontrado alguns erros. Um artigo a mais, uma preposição a menos, uma inversão de letras e, eventualmente, algumas bobagens tamanho família, como um "mais", quando o certo seria "mas". Não achei, ainda, erros gritantes de concordância (espero que não existam). Mas isso não é lá muita vantagem: os gramáticos de hoje admitem que a maioria já 'podem' e o casal 'fazem', desde que sob determinadas circunstâncias.
     Acreditem: quase todos são provocados por um defeito que me acompanha há alguns anos: normalmente não releio o que escrevo. Sequer passo o corretor, um hábito que já esteve incorporado ao meu dia-a-dia (não abro mão desses hífens) durante muitos anos nas redações. Para agravar, uso - sem muita habilidade, confesso - o 'copia e cola', depois de refazer ideias e parágrafos, deixando rastros dos textos anteriores.
     Só mais tarde - como hoje , por exemplo -, quando alertado especialmente por Fabiana, minha filha mais nova, leitora fiel e revisora implacável (é professora de Português e Espanhol), volto aos textos e tropeço em falhas que deveriam ter sido evitadas. Não prometo eliminá-los (aos erros), embora devesse. Mas vou tentar evitá-los.

domingo, 13 de março de 2011

Rali, só no asfalto

     A mais recente campanha da Volkswagem - a do Gol Rallye - despertou em mim a vontade de falar de automóveis, tema que fez parte da minha vida por muitos anos, quando editor do caderno de Carro e Moto do velho Jornal do Brasil, nos anos 90. Para começo de conversa: não tentem colocar o carrinho na areia ou lamaçal. O único rali que modelos como o Gol e semelhantes podem enfrentar, com sucesso, é o das estradas asfaltadas. Vá lá: caminhos de terra também não representam problema, desde que não muito esburacados.
     O único diferencial - pelo menos o mais relevante - de todos essses modelos fantasiados para a aventura é a calibragem da suspensão, que proporciona maior distância do solo. Isso que dizer, apenas, que o carro pode passar sem muito risco sobre obstáculos (pedras ou lombadas) medianos.
Para enfrentar desafios mais radicais, só mesmo com a opção da tração nas quatro rodas, mais comum em utilitários esportivos e picapes (a Subaru, marca japonesa, é uma das exceções mais marcantes da indústria, pois seus modelos oferecem esse - digamos - conforto).
     No Brasil, o segmento da aventura começa (em termos de custo) com o EcoSport 4x4, da Ford, e com o Pajero TR4, da Mitsubishi e, com muita (mas muita, mesmo) boa vontade, com o Palio Weekend Adventure Locker, da Fiat. O resto é alegoria, com muito plástico injetado e, apenas, cara de valente.

Mão única na Líbia

     As limitações à interferência em assuntos internos das nações - um preceito que deveria ser pétreo nas relações internacionais - está criando um enorme e aparentemente insolúvel impasse na discussão sobre o futuro da Líbia. Em certo momento da insurreição que tomou conta do país, o ditador e terrorista Muammar Kadafi pareceu, aos olhos de todos nós, que estava encurralado e que sua queda seria uma questão de dias.
     O mundo, acreditando nesse desdobramento da crise, apostou num final semelhante ao do Egito. E limitou-se a emitir sinais de desaprovação aos atos de violência indiscriminada contra a população. França e Portugal, antecipando-se a outros países, anunciaram que não reconheciam mais o governo de Kadafi. Uma medida de bons efeitos midiáticos, mas de reduzida efetividade. Agora, são os países da Liga Árabe que já não reconhecem o ditador.
     Talvez seja tarde. Usando a força da fortuna que acumulou em 41 anos de poder e saqueando os cofres do país, Muammar Kadafi vem conseguindo reconquistar o terreno perdido nos primeiros dias da revolta, usando de todos os meios que estão à sua disposição.
     E o que vai fazer o mundo, caso prevaleça a reconquista de poder que vem se esboçando? Entrar em guerra com uma nação independente? Repetir os erros americanos no Iraque? A encruzilhada que se adivinhava está se tornando um caminho de mão única.
    
     PS: Ninguém precisa procurar motivos, nem desculpas, para, enfim, condenar o regime líbio. Eles sempre estiveram por lá, embora muitos teimassem em ignorá-los. A prisão de um jornalista brasileiro, no entanto, não deve ser vista como uma dessas razões. A violência contra o ser humano, sim. Nada justifica a coronhada que o correspondente do jornal O Estado de São Paulo recebeu, ou os dias que passou em uma solitária. Mas a detenção, em si, não foi ilegal (embora imoral), já que o repórter entrara no país sem o visto necessário. Para os que olham o mundo sem uma deturpada dicotomia, a Líbia - uma das ditaduras queridinhas do governo brasileiro passado - é um país terrorista há muito anos, e não apenas há uma semana.

sábado, 12 de março de 2011

O emocionante Cartola

     Confesso que me emocionei, no fim da noite de ontem, começo da madrugada de hoje, com o especial da TV Globo sobre Angenor de Oliveira, o Cartola, um gênio da música popular brasileira, talvez o maior do século que passou. Quanto mais escuto Cartola e conheço sua vida, mais me convenço que ele foi um desses fenômenos que surgem de tempos em tempos, desafiadores, inexplicáveis, teoricamente impossíveis, avassaladoramente fortes.
     Eu olho, vejo, escuto e o encantamento aumenta geometricamente. Um negro pobre, que viveu em favelas a maior parte da vida, perdeu a mãe muito cedo, foi deixado de lado pelo pai, lavou carro e serviu cafezinho em um ministério transpira algo como "as rosas não falam, simplesmente as rosas exalam o perfume que roubam de ti". Ou vislumbra que "a vida é um moinho", capaz de 'triturar sonhos" e "reduzir ilusões a pó".
     Alguém capaz de produzir esses sentimentos e imagens tão definitivos e poéticos deveria ser cultuado e apresentado sempre às novas gerações. Não apenas como um compositor fantástico, até certo ponto inigualável, mas como uma referência da mais pura cultura brasileira.

sexta-feira, 11 de março de 2011

Histórias de Júlia e Pedro (6)

     A atração pelos livros
     Júlia desde cedo mostrou um enorme prazer com os livros. Estimulada pela leitura noturna de histórias clássicas e/ou modernas, desenvolveu uma atração bem forte por livrarias. Ir  a um shopping, para ela, significava passar bons momentos folheando livrinhos e escolhendo o exemplar que iria levar para casa.
     Essa ligação com a leitura chegou ao máximo quando ela estava a caminho dos seis anos e já conseguia decifrar o significado daquelas sequências de letras impressas nos mais diversos tipos de papel. Por essa época, fomos todos passar parte das férias num hotel-fazenda. Os dias que antecederam a viagem foram de enorme ansiedade para ela, que contava o tempo.
     Em um desses momentos, bombardeou a mãe com perguntas sobre o hotel. Flávia, então, começou a descrever as atrações que esperavam por ela e por Pedro, na época, um molequinho de pouco mais de um ano:
     - O hotel tem piscinas, lago, animadores ...
     A reação de Júlia ao mundo de atrações foi, ao mesmo tempo, emocionante (para nós) e engraçada. No meio da frase, interrompeu a mãe com uma pergunta que poderia parecer absolutamente inusitada, se não partisse dela:
     - Mas mamãe, lá tem livraria?