terça-feira, 15 de maio de 2012

Os dois lados de uma vilania

     As declarações do diplomata e ex-secretário de Direitos Humanos, Paulo Sérgio Pinheiro, manchete interna de O Globo, às vésperas da posse da Comissão da Verdade, não contribuem com a concertação brasileira. Ao afirmar que falar em dois lados, no caso do enfrentamento entre guerrilheiros e agentes do Regime Militar, é uma "bobajada" e que "o outro lado já foi suficentemente condenado, assassinado, desaparecido etc", ele nega suas próprias convicções e acirra o ambiente de confrontação.
     Afinal, há, ou não, dois lados? Pelo que se depreende do pensamento do ex-secretário, depende do interesse momentâneo, já que o "outro lado" - no caso, os que enfrentaram o Governo de então - já teria purgado todos os crimes eventuais. Restaria, então, punir o "outro lado", o oficial.
     Não tenho dúvidas - e já escrevi isso algumas vezes - que as ações de grupos militares, especialmente entre 1969 e 1974, flertaram com a vilania. Não se pode admitir, sob qualquer ótica, que agentes da Lei usem atos criminoso para alcançar seus objetivos. A tortura, entre todos os atos bárbaros praticados pelo homem, é uma das mais nefastas expressões de covardia.
     E houve tortura, sim. Assim como houve mortes de prisioneiros. Não há justificativas para esconder esses fatos da população. E a Comissão da Verdade, como proposta, tem tudo para agir como um agente do reencontro do país com sua história recente, sem mentiras, desvirtuamentos.
     O que não aceito - em hipótese alguma - é a determinação de visitar apenas um dos tais lados que o ex-secretário afirma que existem e se desdiz logo depois. Quando se fala em tortura, não podem ser esquecidos os sequestros de diplomatas estrangeiros. Ou matar motoristas e sequestrar embaixadores e/ou cônsules não é uma forma de tortura? E o assassinato, a coronhadas, de um prisioneiro aceito como refém, como pode ser qualificado?
     E a explosão de um viajante, civil, absolutamente inocente, em um atentado a bomba, no aerporto de Recife? Esse lado também deveria ser exposto, com a mesma isenção, para que os fatos sejam postos nos seus devidos lugares.
     Escolher 'um lado' é uma atitude indigna de pessoas ungidas para compor um colegiado tão importante quanto a Comissão que começa amanhã sua longa jornada de dois anos.

Um comentário:

  1. Pois é, Marco. É a isso que chamam "verdade".
    Vingança pura e simples de quem foi derrotado (graças a Deus!) e agora quer acertar as contas...
    Parabéns pelo posicionamento isento e correto.

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