segunda-feira, 21 de maio de 2012

A 'democracia' petista

     José Eduardo Cardozo é, para mim, um dos exemplos mais acabados da irresponsabilidade oficial na escolha do primeiríssimo escalação dessa nossa pobre República. Seu antecessor mais destacado no cargo de ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, ao menos, provou e vem provando a capacidade de lidar com malfeitores. É, no mínimo, um excelente advogado de porta de xadrez.
     Seu - dele, Bastos - feito mais eloquente foi, sem dúvida, administrar com sucesso o maior escândalo da história brasileira, o Mensalão do Governo Lula, na época, o mais bem-sucedido assalto formal aos cofres públicos. A capacidade de livrar criminosos da cadeia e da cassação imediata e merecida o credenciou, como estamos acompanhando, a lutar com todo denodo pelo contraventor Carlinhos Cachoeira, um comprovado corruptor de políticos em geral e governantes em especial.
     Já as credencias do atual ministro da Justiça, ex-secretário-geral do PT, limitam-se a uma fidelidade canina ao ex-presidente Lula e à quadrilha de mensaleiros e aloprados, aos quais sempre defendeu, e à fantasia de liberal, compreensivo e contemporizador que vestia e continua vestindo. Continua, no presente, exercendo a enorme capacidade de tergiversar, de fingir equilíbrio, de não dizer, de esgrimir pensamentos, manipular palavras. Mas sempre com aquele ar de artista mambembe que, por incrível que pareça, engana muita gente, especialmente aqueles que querem ser enganados.
     A entrevista que concedeu hoje ao Estadão é um exemplo dessa arte. Para começar, é classificado como alguém conhecido por "recomendar juízo a seus interlocutores". Que bonzinho ... Em seguida, ao falar, retoricamente, sobre o julgamento do Mensalão e a CPI destinada a apurar o envolvimento de Carlinhos Cachoeira com políticos e empresas, saiu-se com essa pérola, que reproduzo, integralmente:
     "Um julgamento como o do Mensalão será amplamente debatido, ao longo das eleições. Se vai atrapalhar ou ajudar, vamos aguardar. Pode ajudar uns, prejudicar outros. O mesmo pode valer para o caso Cachoeira e outras campanhas eleitorais, como por exemplo a de José Serra, caso as forças políticas que as apoiem estejam envolvidas no escândalo."
     Em poucas linhas, o ajuizado ministro disse que não sabe se o julgamento do Mensalão vai atrapalhar ou ajudar alguém, mas destaca que o caso Cachoeira pode interferir na campanha de José Serra - citado nominalmente - à prefeitura de São Paulo. Como se a pilantragem descoberta em Goiás afetasse apenas os partidos de Oposição (DEM e PSDB), e não a praticamente todas as agremiações, com destaque para o PT do governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz.
     O Mensalão, que é do PT, pode afetar alguém (no caso, o candidato petista Fernando Haddad), ou não. Já a torrente de crimes liderada por Cachoeira, que é de quase todos, deve atingir Serra. É um ponto alto da capacidade de manipular ideias.
     Ainda na entrevista, ao falar da Comissão da Verdade, o ministro consegue alcançar outro destaque na vigarice retórica. Eu não estava lá, mas imagino sua expressão de canastrão mexicano ao falar em liberdade e democracia, quando instado a comentar a reação de agremiações militares ao rumo das investigações sobre o passado recente: "Nós vivemos numa democracia. Então, mesmo aqueles que no passado foram contra essa democracia hoje podem se valer dela para expressar suas opiniões. Talvez um dia, quem sabe, eles se convençam de que a democracia é bem-vinda."
     Vejam bem: para ele, apenas os militares que participaram da ditadura eram contra a democracia. Convenientemente, nosso preclaro ministro esqueceu que grande parte dos adversários do regime tinha horror à liberdade e lutava pela implantação de um regime tão ou ainda mais violento e arbitrário quanto o que por aqui reinava. E que a democracia, mesmo quando já reativada aqui, foi constantemente agredida por seu partido, que negou seu voto a Tancredo Neves, recusou-se a assinar a Constituição de 1988, pregou a desordem no governo de FHC e defende ardorosamente a censura.
     Se há uma instituição, nesse país, que vem usando a liberdade da democracia para destrui-la, é, sem a menor dúvida, o PT do ministro da Justiça e seus assemelhados.

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