terça-feira, 6 de março de 2012

Entre o servilismo e os pontapés

     Achei até engraçada a pressa com que alguns dos nossos formadores de opinião partiram para defender a reação brasileira à última agressão da Fifa (através de seu secretário-geral) ao país. Era como se estivessem desembainhando as espadas do bem contra agentes do lado escuro da força, representado pela entidade máxima do futebol mundial.
     A minha talvez tenha sido uma das pouquísimas vozes a denunciar a promiscuidade que se avizinhava e intuía, quando do encontro da nossa presidente com esse mesmo personagem agora execrado, esse sempre arrogante Jérome Valcke, ano passado, no escritório dele, na Suíça. Mais recentemente, o sujeito andou por aqui, merecendo honras concedidas a chefes de estado.
     Falou tantas bobagens quanto agora - eventualmente num tom abaixo. E não houve comoção, pois ainda não havia chegado ao paroxismo da sugestão de dar um pontapé no traseiro verde e amarelo, embora já andasse distribuindo patadas retóricas por todos os lados, explorando nosso imenso provincianismo e dependência política de fatos populares, como a Copa do Mundo.
     Ele sabia que nosso governo tremia só em pensar em perder a Copa do Mundo, marcada justamente para o ano da graça eleitoral de 2014, e claramente se divertia com isso. Uma piada aqui, uma estupidez ali, e lá se foi o tal burocrata franco-suíço que, no meio do caminho recente, assistiu, de camarote, à demissão do seu interlocutor anterior, o ex-ministro Orlando Silva, acusado de envolvimento em atos não muito republicanos.
     A arrogância chegou ao limite de a Fifa exigir mudanças na legislação brasileira, que sabiamente passou a proibir a venda de bebidas alcoólicas nos estádios de futebol. Isso, para atender a um de seus patrocinadores, uma famosa marca de cerveja. E nós - é isso mesmo, nós, através do nosso Governo - aceitamos tentar alterar a lei, para agradar a uma fábrica de cerveja.
     Paralelamente, há a constatação - e não temos como rebater essa acusação - de que as obras contratadas estão atrasadas, que nossos aeroportos continuam péssimos, que a rede hoteleira não está capacitada a atender à esperada demanda, que o sistema de transporte é caótico e tudo o mais que se possa imaginar, incluindo as onipresentes denúncias de superfaturamento e desvio de verbas.
     O conjunto da obra deu ao tal burocrata do futebol a impressão que poderia dar caneladas à vontade. Recebeu o troco no mesmo patamar, nivelando a disputa por baixo, muito por baixo. Ele talvez não soubesse que no time de cá também existe um cabeça-de-bagre sempre a postos para entrar em campo e distribuir cusparadas e outros golpes abaixo da linha da cintura.
     Como disse ontem: eles se merecem.

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