quinta-feira, 12 de julho de 2012

Um aula com FHC

     Jamais escondi - e não vejo motivo algum para isso - que tenho uma dose bem grande de admiração pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em quem tive o prazer de votar duas vezes. 'Divergimos' - eu me permito essa arrogância, à distância - em alguns pontos, mas as afinidades, no atacado, são muito grandes. Poucas pessoas teriam, como ele, o desprendimento de assumir posições e atitudes que provocariam reaçõe adversas, sem se prender apenas ao jogo do poder, à busca pela manutenção do poder, como é comum na política. Não elegeu seu sucessor, mas manteve intacto o respeito que o mundo que interessa tem por ele - e o respeito próprio, certamente.
     Ontem - estou escrevendo no fim da noite de quarta-feira -, Fernando Henrique recebeu uma das maiores honrarias que pode ser atribuída a um intelectual e político, não obrigatoriamente nessa ordem: o Prêmio Kluge, pela sua produção acadêmica, oferecido pela Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. Foi o primeiro latino-americano a receber a honraria, uma espécie de Nobel da atividade intelectual como um todo. E a atribui, em grande parte, à importância que o Brasil conquistou entre as nações. Não o 'seu Brasil', mas o país que vem sendo construído progressivamente. O país que - acreditem! - não foi inventado pelo antecessor da atual presidente.
     Durante entrevista a corespondentes brasileiros em Washington, FHC falou de temas atuais e apontou, com a clareza que se espera de um homem com sua capacidade, mais uma vez, um dos males da vida política brasileira: a falta de substância ideológica dos partidos. "São apenas siglas", condenou, com a razão que falta à maioria dos nossos representantes.
     Não por acaso - mas com muito menos brilho e relevância -, tenho me fixado muito nesse ponto, na falta de conteúdo do mundo político, onde vicejam agremiações de aluguel, sem caráter e forma, ao lado de outras - teoricamente mais ajustadas - que trocam a dignidade pelo voto fácil. O pensamento cedeu lugar aos lugares-comuns; à ligeireza intelectual; ao uso de qualquer artimanha para manter o poder; aos artifícios condenáveis destinados a conquistar um cargo aqui, uma diretoria ali, um suborno acolá (e bota suborno nisso).
     A O Globo, Fernando Henrique garantiu, no entanto, que, apesar da falta de debate político, da "dissolução da visão partidária", é possível fazer oposição, que deve ser executada "a partir de uma posição política".
     O Brasil ainda vai conferir formalmente a Fernando Henrique Cardoso a dimensão que jamais deixou de ter.

Nenhum comentário:

Postar um comentário