domingo, 26 de junho de 2011

Em nome da dignidade

     Entre as anotações em pedaços de jornal que fiz durante meu recesso forçado pela incompetência da OI, em especial nos dias em que estava acamado, vítima de uma gripe há muito não experimentada, encontrei uma que considero especial: a referência à decisão brasileira de dar ao assassino e terrorista italiano Cesare Battisti o direito de trabalhar livremente por aqui, como se um imigrante legal e decente fosse.
     Como se fosse alguém semelhante, por exemplo, ao meu pai, um português de Ponte de Lima que aqui desembarcou ainda muito menino, acompanhando os pais, que vieram 'fazer o Brasil', no início dos anos 1910, e por aqui ficaram, formando gerações de brasileiros.
     Meu pai, que jamais se naturalizou, conquistou os direitos hoje oferecidos a esse criminoso graças a muito trabalho. Aos 16 anos, seguindo os passos do meu avô, começou a trabalhar na antiga Companhia de Navegação Costeira. Aos poucos, foi conquistando espaços, até alcançar o posto mais alto da carreira. Uma carreira que sofreu uma mudança drástica, para melhor, quando o então presidente Getúlio Vargas encampou a empresa e a transformou em uma autarquia, preservando seus funcionários.
     De um momento para outro, aquele jovem português, que continuou português, passava a ser funcionário público, por decreto. Foram trinta e cinco anos de trabalho árduo, das 8 às 17 horas, sem faltas ou atrasos. Quando mudamos para o então ainda mais longínquo subúrbio de Marechal Hermes, no início dos anos 1950, saía de casa às 5h30 da manhã, para garantir seu lugar no primeiro banco do ônibus (linha 378, Castelo-Marechal) que o deixava em frente ao armazém 13, no Cais do Porto,on de funcionara a estação de passageiros, bem antes do horário determinada.
     Preferia chegar muito cedo a perder a hora por causa de um - na época - ainda eventual engarrafamento na Avenida Brasil. Aposentado, pouco pôde aproveitar: morreu pouco mais de um ano após ter deixado a ativa.
     Em respeito à sua memória, formalizo um pedido às atuais autoridades: não queremos - eu e meu irmão - que ele faça parte do mesmo grupo que acaba de receber, como membro, alguém que assassinou cruelmente quatro pessoas, em nome da mais pura intolerância, da estupidez. Que seus arquivos sejam destruídos, sua ficha de funcionário exemplar apagada. Para nós, basta a memória. Não deixem que seu nome fique misturado a esse tipo de gente.

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