terça-feira, 28 de junho de 2011

Do lixo ao luxo, sem baldeação

     Não conheci Sérgio Cabral, o filho. Conheci e admirei o pai, embora nunca tenha trocado com ele mais de duas frases, na tribuna de imprensa do Maracanã, todas geradas pela paixão comum pelo Vasco. Sei que o nosso governador também é jornalista (e vascaíno), como eu. A diferença de idade talvez explique o fato de jamais ter esbarrado com ele nos corredores das redações por onde passei.
     Acho que o governador nunca trabalhou no antigo e ainda decente Jornal do Brasil dos anos 1980 e 1990. Muito menos no O Globo do meu tempo (anos 1970). Talvez tenha estagiado em outras páginas, e por lá brilhado. Seu pai, com certeza, brilhou em todos os lugares por onde andou.
     Somos, os dois, suburbanos históricos - menos ele do que eu, é verdade. Meu subúrbio ficava mais distante do Lins da juventude Cabralina. Marechal Hermes, na minha infância, era uma espécie de apêndice de Madureira, que por sua vez venerava o Méier, que sonhava em ser a Tijuca que, mais tarde, delirava com a Barra.
    Conheci Muriqui, onde o governador teria uma mansão, quando ainda era rapazola. Pegava o 'macaquinho' - um trem com vagões de madeira - em Deodoro (estação vizinha a Marechal Hermes) e lá ia em direção às ainda agrestes praias da Costa Verde, levando sanduíches e garrafas de água.
     Mais novo um pouco, mas já com idade para 'peitar' meus pais e ir à praia 'sozinho', mergulhava, mesmo, em Sepetiba, fugindo do lodo que, naquela época, era considerado medicinal. Não esqueço o domingo em que desembarcamos em Sepetiba saídos diretamente da caçamba do caminhão do Cunha, um português recém-chegado ao Brasil e que morava nos fundos de uma carvoaria vizinha à minha casa. É isso mesmo: eu ia à praia, de caminhão ...
     Anos mais tarde, jornalista com razoável histórico, é bem verdade que pude mergulhar no Mediterrâneo, no intervalo entre uma viagem ou outra a trabalho.
     Sérgio, o governador, passou direto por tudo isso. Do subúrbio a Cannes, sem fazer baldeação. Da Tijuca à praia particular na Baía de Angra. De defensor dos jovens e velhos desprezados, a protetor perpétuo dos bem-sucedidos.
     Oldemário Touguinhó, lendário jornalista esportivo que fez toda sua vida no Jornal do Brasil, quando queria 'mexer' com o excelente repórter Antônio Maria Filho, dizia que o pai dele, o jornalista, compositor e boêmio Antônio Maria, gastara toda a malandragem da família.
     Aqui no meu canto da Pedra, sou forçado - pelo recente noticiário - a admitir que Sérgio Cabral pai consumiu toda a aura de dignidade pública reservada à geração que o sucedeu.

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