Tenho uma natural repulsa por assassinos e torturadores,
sentimento que se amplia exponencialmente quando são agentes de um estado. Um
estado, por definição, não pode agir como um vulgar bandoleiro. Seria desonroso,
imoral, indecente, repugnante. Quanto a esse ponto, em particular, não tenho
reparos a fazer ao trabalho desenvolvido pela Comissão Nacional da Verdade. Colocar baratas na vagina de uma prisioneira é algo incompatível com qualquer
padrão de humanidade, de respeito à dignidade do outro.
Acredito que o Brasil precisava saber, sim, que fatos como
esse aconteceram ao longo de vinte anos, protagonizados por agentes que se
escudavam no poder vigente para praticar atos de extremo sadismo e ódio. A
História de uma Nação, como a entendo, não pode ser construída sobre mentiras, jogos
de palavras, malabarismos retóricos, negaças que não se sustentam quando
confrontadas com a realidade.
Não resta dúvida que, sob esse aspecto, a Comissão prestou
um enorme serviço ao País, deu um passo que poderia significar, afinal, a
superação de um dilema mal resolvido para muitos. Infelizmente, por uma
inaceitável opção político-ideológica, essa mesma Comissão incorreu em erros
que, na minha ótica, comprometem os resultados alcançados após tanto tempo e
sob tantas expectativas.
O maior deles, certamente, foi a opção por ignorar que os
desatinos não foram cometidos apenas e tão-somente pelos agentes oficiais. Como
é possível passar ao largo de atos ignominiosos como os assassinatos de simples
motoristas de táxi, bancários e camponeses, para ficarmos apenas nas vítimas
civis de atos tão terroristas quanto a colocação de bombas no Riocentro e na
OAB?
Como é possível repudiar – como repudio, veementemente!!! –
a execução de prisioneiros em dependências policiais e silenciar quanto à
morte, a coronhadas, de um jovem oficial da PM paulista que se oferecera como
refém, para possibilitar o atendimento de feridos, de ambos os lados, em um
choque entre policiais e um grupo comandado pelo ex-capitão Lamarca? Ou
esquecer que um jovem soldado, cumprindo o serviço militar obrigatório, foi
destroçado pela explosão de um carro recheado de dinamite?
Errou, também, a Comissão, e de maneira até certo ponto
irresponsável, ao jogar na mesma vala comum e podre alguns personagens da nossa
história recente que, por seus atos e currículo, mereciam um olhar mais detalhado,
reflexivo. A inclusão do ex-presidente Humberto de Alencar Castelo Branco e do
brigadeiro Eduardo Gomes, por exemplo, em uma na lista de criminosos beirou a “leviandade”,
como justamente ponderam alguns oficiais.
Ao escolher apenas um caminho, a Comissão pecou, por escalavrar
ainda mais a ferida que a geração responsável pela redemocratização do país e que
forjou a Anistia tentou fechar. A meia verdade – escrevi há uns dois dias –
acaba se transformando em uma grande mentira.
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