segunda-feira, 9 de junho de 2014

O tiro no pé

     Essa lastimável Era Lula, prestes a completar doze anos, tem, ao menos, uma grande obra para legar à posteridade. Nunca, jamais, em tempo algum, um governo – nem mesmo o mais violento deles, o do general Garrastazu Médici – conseguiu retirar, da população, o encanto de festejar a Seleção Brasileira de futebol plenamente.
     Não quero dizer, com isso (seria uma tolice!), que o brasileiro deixará de torcer pela vitória da equipe, pela conquista do Mundial. É evidente que os resultados serão comemorados. Mas o País não se vestiu de verde e amarelo, não teve suas ruas e casas enfeitadas, como em todas as últimas ocasiões semelhantes.
     Há bolsões festivos, espalhados. Assim como há carros enfeitados com bandeirolas. Mas não há o clima que seria de se esperar em uma ocasião como essa, quando sediamos uma Copa do Mundo. A população, com sua reticência, está exibindo não a contestação de Neymar e companhia, mas, sim, sua insatisfação com os atos de dirigentes que ela, população, já não aceita.
     A fórmula barata, populista e demagógica do pão e circo parece ter se esgotado, o que, em tese, comprovaria o amadurecimento da nação. O tiro imaginado em 2007, quando o governo Lula investiu na candidatura brasileira, acertou o pé de quem imaginava poder comprar o inconsciente coletivo e conquistar com facilidade mais um par de anos de poder.


sábado, 7 de junho de 2014

O apelo à demagogia

     Para quem viveu, como eu, os anos da ditadura e, como eu, conviveu com o apelo ao que eu classifico de ‘patriotismo de botequim’, ao “ame-o ou deixe-o”, a comparação com o recorrente “nunca antes nesse país” que vem sendo impingido à população nos últimos quase doze anos é inevitável. A essência é a mesma, exposta na postura de únicos intérpretes da vontade nacional.
     Acossado pelo desencanto popular com a precariedade absoluta dos serviços públicos e imprensado pelos números cada vez mais desastrosos das pesquisas de opinião, o Governo vem investindo, sem o menor constrangimento moral, nessa velha e deplorável tática de classificar adversários e críticos como inimigos da Pátria, como um todo, e da ‘pátria de chuteiras’, em especial, nos últimos dias.
     De maneira coordenada e pensada pelos marqueteiros sempre de plantão, a ainda presidente Dilma Rousseff, em solenidade de campanha no Sul do País, insistiu mais uma vez nessa toada destinada a desqualificar todas as manifestações de insatisfação, não apenas aquelas que extrapolam os limites legais. De maneira torta, tenta misturar sentimentos que podem, sim, conviver.
     Exigir dignidade dos governantes e responsabilidade no trato da coisa pública são comportamentos que jamais podem ser confundidas com uma atitude de desapreço à Seleção Brasileira, aos símbolos nacionais, como o Governo pretende fazer crer.
     É possível torcer por vitórias em todos os campos, com a mesma determinação. Ao dizer que nem mesmo quando estava presa deixou de torcer pela Seleção – como fez ontem -, nossa presidente apela ao discurso mais medíocre, fuleiro, demagógico e populista.

     É evidente – e ela sabe disso – que a maioria absoluta da população vai torcer pela Seleção, como sempre fez. Esse sentimento não está em discussão. A grande novidade surgiu quando o brasileiro decidiu questionar não sua paixão pelo futebol, seus atletas, ou equipe, mas a propriedade de gastos públicos exorbitantes com um projeto secundário (a Copa), num país tão carente de tudo.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Ameaça à democracia

     A relativíssima reação ao decreto da presidente Dilma Rousseff que cria uma tal de ‘Política Nacional de Participação Social’ é preocupante. Com as exceções de sempre (Veja e alguns líderes da oposição), o tema não vem fazendo parte da pauta de discussões, atropelado – como certamente previa o Governo – pelo noticiário que envolve a Copa do Mundo. A ocasião – tenho que reconhecer - não poderia ter sido mais bem escolhida.
     Poucas pessoas estão preocupadas com a enorme ameaça às instituições representada pela criação de espécies de conselhos populares que teriam voz ativa na administração pública, definindo prioridades e políticas. Admito que, à primeira vista, essa ‘participação’ pode ser encarada como saudável, democrática. Basta um minuto de reflexão para constatar que a essência do decreto, ao contrário, agride os princípios de representatividade.
     Por um motivo simples: os ‘conselhos’ serão formados por – adivinhem? – integrantes de movimentos sociais, um evidente eufemismo para mascarar uma realidade: mais poder, ainda, à companheirada, que, na prática, usurparia parte dos poderes do Legislativo. E não importa, nessa discussão, que nossos representantes legais deixem a desejar. O processo de intermediação entre anseios populares e o Executivo cabe a eles, e não a algumas dessas ‘ongs’ que sobrevivem sugando os cofres públicos.
     E se eu tivesse, por acaso, alguma dúvida em relação à ameaça oculta nessa ‘companheirização’ da política pública, bastaria saber que um de seus defensores mais intransigentes é o ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria Geral da Presidência. Nada, rigorosamente nada, que tenha seu – dele, Carvalho - apoio atende a propósitos democráticos.

     Num país mais crítico de si mesmo, alguém com o histórico do ministro mais poderoso do atual Governo estaria condenado ao ostracismo, ou, eventualmente, a penas mais duras. Basta mergulhar, mesmo superficialmente, no lastimável episódio do assassinato do prefeito Celso Daniel, de Santo André (SP), em 2002, um caso que continua provocando pesadelos no PT.